Michel Foucault (1975) em Vigiar e Punir (Terceira Parte, Capítulo II). Petrópolis: Editora Vozes, 1999.
© Editions Gallimard, 1975. Título do original francês: Surveiller et punir.
1 – Walhausen, bem no início do século 17, falava da “correta disciplina”, como uma arte do “bom adestramento” (2). O poder disciplinar é com efeito um poder que, em vez de se apropriar e de retirar, tem como função maior “adestrar”; ou sem dúvida adestrar para retirar e se apropriar ainda mais e melhor. Ele não amarra as forças para reduzi-las; procura ligá-las para multiplicá-las e utilizá-las num todo. Em vez de dobrar uniformemente e por massa tudo o que lhe está submetido, separa, analisa, diferencia, leva seus processos de decomposição até às singularidades necessárias e suficientes. “Adestra” as multidões confusas, móveis, inúteis de corpos e forças para uma multiplicidade de elementos individuais — pequenas células separadas, autonomias orgânicas, identidades e continuidades genéticas, segmentos combinatórios. A disciplina “fabrica” indivíduos; ela é a técnica específica de um poder que toma os indivíduos ao mesmo tempo como objetos e como instrumentos de seu exercício. Não é um poder triunfante que, a partir de seu próprio excesso, pode-se fiar em seu superpoderio; é um poder modesto, desconfiado, que funciona a modo de uma economia calculada, mas permanente. Humildes modalidades, procedimentos menores, se os compararmos aos rituais majestosos da soberania ou aos grandes aparelhos do Estado. E são eles justamente que vão pouco a pouco invadir essas formas maiores, modificar-lhes os mecanismos e impor-lhes seus processos. O aparelho judiciário não escapará a essa invasão, mal secreta. O sucesso do poder disciplinar se deve sem dúvida ao uso de instrumentos simples: o olhar hierárquico, a sanção normalizadora e sua combinação num procedimento que lhe é específico, o exame.
A VIGILÂNCIA HIERÁRQUICA
2 – O exercício da disciplina supõe um dispositivo que obrigue pelo jogo do olhar; um aparelho onde as técnicas que permitem ver induzam a efeitos de poder, e onde, em troca, os meios de coerção tornem claramente visíveis aqueles sobre quem se aplicam. Lentamente, no decorrer da época clássica, são construídos esses “observatórios” da multiplicidade humana para as quais a história das ciências guardou tão poucos elogios. Ao lado da grande tecnologia dos óculos, das lentes, dos feixes luminosos, unida à fundação da física e da cosmologia novas, houve as pequenas técnicas das vigilâncias múltiplas e entrecruzadas, dos olhares que devem ver sem ser vistos; uma arte obscura da luz e do visível preparou em surdina um saber novo sobre o homem, através de técnicas para sujeitá-lo e processos para utilizá-lo.
3 – Esses “observatórios” têm um modelo quase ideal: o acampamento militar. É a cidade apressada e artificial, que se constrói e remodela quase à vontade; é o ápice de um poder que deve ter ainda mais intensidade, mas também mais discrição, por se exercer sobre homens de armas. No acampamento perfeito, todo o poder seria exercido somente pelo jogo de uma vigilância exata; e cada olhar seria uma peça no funcionamento global do poder. O velho e tradicional plano quadrado foi consideravelmente afinado de acordo com inúmeros esquemas. Define-se exatamente a geometria das aléias, o número e a distribuição das tendas, a orientação de suas entradas, a disposição das filas e das colunas; desenha-se a rede dos olhares que se controlam uns aos outros:
Na praça d’armas, tiram-se cinco linhas, a primeira fica a 16 pés da segunda; as outras ficam a 8 pés uma da outra; e a última fica a 8 pés dos tabardos. Os tabardos ficam a 10 pés das tendas dos oficiais inferiores, precisamente em frente ao primeiro bastão. Uma rua de companhia tem 51 pés de largura… Todas as tendas ficam a dois pés umas das outras. As tendas dos subalternos ficam em frente às ruelas de suas companhias. O bastão de trás fica a 8 pés da última tenda dos soldados e a porta olha para a tenda dos capitães… As tendas dos capitães ficam levantadas em frente às ruas de suas companhias. A porta olha para as próprias companhias (2).
4 – O acampamento é o diagrama de um poder que age pelo efeito de uma visibilidade geral. Durante muito tempo encontraremos no urbanismo, na construção das cidades operárias, dos hospitais, dos asilos, das prisões, das casas de educação, esse modelo do acampamento ou pelo menos o princípio que o sustenta: o encaixamento espacial das vigilâncias hierarquizadas. Princípio do “encastramento”. O acampamento foi para a ciência pouco confessável das vigilâncias o que a câmara escura foi para a grande ciência da ótica.
5 – Toda uma problemática se desenvolve então: a de uma arquitetura que não é mais feita simplesmente para ser vista (fausto dos palácios), ou para vigiar o espaço exterior (geometria das fortalezas), mas para permitir um controle interior, articulado e detalhado — para tornar visíveis os que nela se encontram; mais geralmente, a de uma arquitetura que seria um operador para a transformação dos indivíduos: agir sobre aquele que abriga, dar domínio sobre seu comportamento, reconduzir até eles os efeitos do poder, oferecê-los a um conhecimento, modificá- los. As pedras podem tornar dócil e conhecível. O velho esquema simples do encarceramento e do fechamento — do muro espesso, da porta sólida que impedem de entrar ou de sair — começa a ser substituído pelo cálculo das aberturas, dos cheios e dos vazios, das passagens e das transparências. Assim é que o hospital- edifício se organiza pouco a pouco como instrumento de ação médica: deve permitir que se possa observar bem os doentes, portanto, coordenar melhor os cuidados; a forma dos edifícios, pela cuidadosa separação dos doentes, deve impedir os contágios; a ventilação que se faz circular em torno de cada leito deve enfim evitar que os vapores deletérios se estagnem em volta do paciente, decompondo seus humores e multiplicando a doença por seus efeitos imediatos. O hospital — aquele que se quer aparelhar na segunda metade do século, e para o qual se fizeram tantos projetos depois do segundo incêndio do Hôtel-Dieu — não é mais simplesmente o teto onde se abrigavam a miséria e a morte próxima; é, sem sua própria materialidade, um operador terapêutico.
6 – Como a escola-edifício deve ser um operador de adestramento. Fora uma máquina pedagógica que Pâris-Duverney concebera na Escola militar e até nos mínimos detalhes que ele impusera a Gabriel. Adestrar corpos vigorosos, imperativo de saúde; obter oficiais competentes, imperativo de qualificação; formar militares obedientes, imperativo político; prevenir a devassidão e a homossexualidade, imperativo de moralidade. Quádrupla razão para estabelecer separações estanques entre os indivíduos, mas também aberturas para observação contínua. O próprio edifício da Escola devia ser um aparelho de vigiar; os quartos eram repartidos ao longo de um corredor como uma série de pequenas celas; a intervalos regulares, encontrava-se um alojamento de oficial, de maneira que
cada dezena de alunos tivesse um oficial à direita e à esquerda; [os alunos aí ficavam trancados durante toda a noite; e Pâris insistira para que fosse envidraçada] a parede de cada quarto do lado do corredor desde a altura de apoio até um ou dois pés do teto. Além disso a vista dessas vidraças só pode ser agradável, ousamos dizer que é útil sob vários pontos de vista, sem falar das razões de disciplina que podem determinar essa disposição (3).
7 – Nas salas de refeições, fora preparado
um estrado um pouco alto para colocar as mesas dos inspetores dos estudos, para que eles possam ver todas as mesas dos alunos de suas divisões, durante as refeições;
haviam sido instaladas latrinas com meias-portas, para que o vigia para lá designado pudesse ver a cabeça e as pernas dos alunos, mas com separações laterais suficientemente elevadas “para que os que lá estão não se possam ver” (4). Escrúpulos infinitos de vigilância que a arquitetura transmite por mil dispositivos sem honra. Só os acharemos irrisórios se esquecermos o papel dessa instrumentação, menor mas sem falha, na objetivação progressiva e no quadriculamento cada vez mais detalhado dos comportamentos individuais. As instituições disciplinares produziram uma maquinaria de controle que funcionou como um microscópio do comportamento; as divisões tênues e analíticas por elas realizadas formaram, em torno dos homens, um aparelho de observação, de registro e de treinamento. Nessas máquinas de observar, como subdividir os olhares, como estabelecer entre eles escalas, comunicações? Como fazer para que, de sua multiplicidade calculada, resulte um poder homogêneo e contínuo?
8 – O aparelho disciplinar perfeito capacitaria um único olhar tudo ver permanentemente. Um ponto central seria ao mesmo tempo fonte de luz que iluminasse todas as coisas, e lugar de convergência para tudo o que deve ser sabido: olho perfeito a que nada escapa e centro em direção ao qual todos os olhares convergem. Foi o que imaginara Ledoux ao construir Arc-et-Senans: no centro dos edifícios dispostos em círculo e que se abriam todos para o interior, uma alta construção devia acumular as funções administrativas de direção, policiais de vigilância, econômicas de controle e de verificação, religiosas de encorajamento à obediência e ao trabalho; de lá viriam todas as ordens, lá seriam registradas todas as atividades, percebidas e julgadas todas as faltas; e isso imediatamente, sem quase nenhum suporte a não ser uma geometria exata. Entre todas as razões do prestígio que foi dado, na segunda metade do século 18, às arquiteturas circulares (5), é preciso sem dúvida contar esta: elas exprimiam uma certa utopia política.
9 – Mas o olhar disciplinar teve, de fato, necessidade de escala. Melhor que o círculo, a pirâmide podia atender a duas exigências: ser bastante completa para formar uma rede sem lacuna — possibilidade em consequência de multiplicar seus degraus, e de espalhá-los sobre toda a superfície a controlar; e entretanto ser bastante discreta para não pesar como uma massa inerte sobre a atividade a disciplinar e não ser para ela um freio ou um obstáculo; integrar-se ao dispositivo disciplinar como uma função que lhe aumenta os efeitos possíveis. É preciso decompor suas instâncias, mas para aumentar sua função produtora. Especificar a vigilância e torná-la funcional.
10 – É o problema das grandes oficinas e das fábricas, onde se organiza um novo tipo de vigilância. É diferente do que se realizava nos regimes das manufaturas do exterior pelos inspetores, encarregados de fazer aplicar os regulamentos; trata-se agora de um controle intenso, contínuo; corre ao longo de todo o processo de trabalho; não se efetua — ou não só — sobre a produção (natureza, quantidade de matérias-primas, tipo de instrumentos utilizados, dimensões e qualidades dos produtos), mas leva em conta a atividade dos homens, seu conhecimento técnico, a maneira de fazê-lo, sua rapidez, seu zelo, seu comportamento. Mas é também diferente do controle doméstico do mestre, presente ao lado dos operários e dos aprendizes; pois é realizado por prepostos, fiscais, controladores e contramestres. À medida que o aparelho de produção se torna mais importante e mais complexo, à medida que aumentam o número de operários e a divisão do trabalho, as tarefas de controle se fazem mais necessárias e mais difíceis. Vigiar torna-se então uma função definida, mas deve fazer parte integrante do processo de produção; deve duplicá-lo em todo o seu comprimento. Um pessoal especializado torna-se indispensável, constantemente presente, e distinto dos operários:
Na grande manufatura, tudo é feito ao toque da campainha, os operários são forçados e reprimidos. Os chefes, acostumados a ter com eles um ar de superioridade e de comando, que realmente é necessário com a multidão, tratam-nos duramente ou com desprezo; acontece daí que esses operários ou são mais caros ou apenas passam pela manufatura (6).
11 – Mas se os operários preferem o enquadramento de tipo corporativo a esse novo regime de vigilância, os patrões, quanto a eles, reconhecem nisso um elemento indissociável do sistema da produção industrial, da propriedade privada e do lucro. Em nível de fábrica, de grande forja ou de mina,
os objetos de despesa são tão multiplicados, que a menor infidelidade sobre cada objeto daria no total uma fraude imensa, que não somente absorveria os lucros, mas levaria a fonte dos capitais…; a mínima imperícia desapercebida e por isso repetida cada dia pode se tornar funesta à empresa ao ponto de anulá-la em muito pouco tempo; [donde o fato que só agentes, diretamente dependentes do proprietário, e designados só para esta tarefa poderão zelar] para que não haja um tostão de despesa inútil, para que não haja um momento perdido no dia; seu papel será de vigiar os operários, visitar todas as obras, instruir o comitê sobre todos os acontecimentos (7).
12 – A vigilância torna-se um operador econômico decisivo, na medida em que é ao mesmo tempo uma peça interna no aparelho de produção e uma engrenagem específica do poder disciplinar (8).
13 – Mesmo movimento na reorganização do ensino elementar; especificação da vigilância e integração à relação pedagógica. O desenvolvimento das escolas paroquiais, o aumento de seu número de alunos, a inexistência de métodos que permitissem regulamentar simultaneamente a atividade de toda uma turma, a desordem e a confusão que daí provinham tornavam necessária a organização dos controles. Para ajudar o mestre, Batencour escolhe entre os melhores alunos toda uma série de “oficiais”, intendentes, observadores, monitores, repetidores, recitadores de orações, oficiais de escrita, recebedores de tinta, capelães e visitadores. Os papéis assim definidos são de duas ordens: uns correspondem a tarefas materiais (distribuir a tinta e o papel, dar as sobras aos pobres, ler textos espirituais nos dias de festa, etc); outros são da ordem da fiscalização:
Os “observadores” devem anotar quem sai do banco, quem conversa, quem não tem o terço ou o livro de orações, quem se comporta mal na missa, quem comete alguma imodéstia, conversa ou grita na rua; os “admonitores” estão encarregados de “tomar conta dos que falam ou fazem zunzum ao estudar as lições, dos que não escrevem ou brincam”; os “visitadores” vão se informar, nas famílias, sobre os alunos que estiveram ausentes ou cometeram faltas graves. Quanto aos “intendentes”, fiscalizam todos os outros oficiais. Só os “repetidores” têm um papel pedagógico: têm que fazer os alunos ler dois a dois, em voz baixa (9).
14 – Ora, algumas dezenas de anos mais tarde, Demia volta a uma hierarquia do mesmo tipo, mas as funções de fiscalização agora são quase todas duplicadas por um papel pedagógico: um submestre ensina a segurar a pena, guia a mão, corrige os erros e ao mesmo tempo “marca as faltas quando se discute”; outro submestre tem as mesmas tarefas na classe de leitura; o intendente que controla os outros oficiais e zela pelo comportamento geral é também encarregado de “adequar os recém-chegados aos exercícios da escola”; os decuriões fazem recitar as lições e “marcam” os que não as sabem (10). Temos aí o esboço de uma instituição tipo escola mútua em que estão integrados no interior de um dispositivo único três procedimentos: o ensino propriamente dito, a aquisição dos conhecimentos pelo próprio exercício da atividade pedagógica, enfim uma observação recíproca e hierarquizada. Uma relação de fiscalização, definida e regulada, está inserida na essência da prática do ensino: não como uma peça trazida ou adjacente, mas como um mecanismo que lhe é inerente e multiplica sua eficiência.
15 – A vigilância hierarquizada, contínua e funcional não é, sem dúvida, uma das grandes “invenções” técnicas do século 18, mas sua insidiosa extensão deve sua importância às novas mecânicas de poder, que traz consigo. O poder disciplinar, graças a ela, torna-se um sistema “integrado”, ligado do interior à economia e aos fins do dispositivo onde é exercido. Organiza-se assim como um poder múltiplo, automático e anônimo; pois, se é verdade que a vigilância repousa sobre indivíduos, seu funcionamento é de uma rede de relações de alto a baixo, mas também até um certo ponto de baixo para cima e lateralmente; essa rede “sustenta” o conjunto, e o perpassa de efeitos de poder que se apoiam uns sobre os outros: fiscais perpetuamente fiscalizados. O poder na vigilância hierarquizada das disciplinas não se detém como uma coisa, não se transfere como uma propriedade; funciona como uma máquina. E se é verdade que sua organização piramidal lhe dá um “chefe”, é o aparelho inteiro que produz “poder” e distribui os indivíduos nesse campo permanente e contínuo. O que permite ao poder disciplinar ser absolutamente indiscreto, pois está em toda parte e sempre alerta, pois em princípio não deixa nenhuma parte às escuras e controla continuamente os mesmos que estão encarregados de controlar; e absolutamente “discreto”, pois funciona permanentemente e em grande parte em silêncio. A disciplina faz “funcionar” um poder relacionai que se auto-sustenta por seus próprios mecanismos e substitui o brilho das manifestações pelo jogo ininterrupto dos olhares calculados. Graças às técnicas de vigilância, a “física” do poder, o domínio sobre o corpo se efetuam segundo as leis da ótica e de mecânica, segundo um jogo de espaços, de linhas, de telas, de feixes, de graus, e sem recurso, pelo menos em princípio, ao excesso, à força, à violência. Poder que é em aparência ainda menos “corporal” por ser mais sabiamente “físico”.
A SANÇÃO NORMALIZADORA
16 – 1) No orfanato do cavaleiro Paulet, as sessões do tribunal que se reunia todas as manhãs davam lugar a um cerimonial:
Encontramos todos os alunos em formação, alinhamento, imobilidade e silêncio perfeitos. O major, jovem da nobreza de dezesseis anos, estava fora da fila, a espada na mão; à sua ordem, a tropa se abalou ao passo duplo para formar o círculo. O conselho se reuniu no centro; cada oficial fez o relatório de sua tropa nas vinte e, quatro horas. Os acusados foram admitidos a se justificar; ouviram-se as testemunhas; deliberou-se e, quando se chegou a um acordo, o major prestou contas em voz alta do número dos culpados, da natureza dos delitos e dos castigos ordenados. A tropa em seguida desfilou na maior ordem (11).
17 – Na essência de todos os sistemas disciplinares, funciona um pequeno mecanismo penal. É beneficiado por uma espécie de privilégio de justiça, com suas leis próprias, seus delitos especificados, suas formas particulares de sanção, suas instâncias de julgamento. As disciplinas estabelecem uma “infra-penalidade”; quadriculam um espaço deixado vazio pelas leis; qualificam e reprimem um conjunto de comportamentos que escapava aos grandes sistemas de castigo por sua relativa indiferença.
Ao entrar os companheiros deverão saudar-se reciprocamente; …ao sair deverão guardar as mercadorias e ferramentas que utilizaram e em época de serão apagar a lâmpada; é expressamente proibido divertir os companheiros com gestos ou de outra maneira; [eles deverão] se comportar honesta e decentemente; [quem se ausentar por mais de cinco minutos sem avisar o Sr. Oppenheim será] anotado por meio-dia; [e para que fique certo que nada será esquecido nessa justiça criminal miúda, é proibido fazer] qualquer coisa que puder prejudicar o Sr. Oppenheim e seus companheiros (12).
18 – Na oficina, na escola, no exército funciona como repressora toda uma micropenalidade do tempo (atrasos, ausências, interrupções das tarefas), da atividade (desatenção, negligência, falta de zelo), da maneira de ser (grosseria, desobediência), dos discursos (tagarelice, insolência), do corpo (atitudes “incorretas”, gestos não conformes, sujeira), da sexualidade (imodéstia, indecência). Ao mesmo tempo é utilizada, a título de punição, toda uma série de processos sutis, que vão do castigo físico leve a privações ligeiras e a pequenas humilhações. Trata-se ao mesmo tempo de tornar penalizáveis as frações mais tênues da conduta, e de dar uma função punitiva aos elementos aparentemente indiferentes do aparelho disciplinar: levando ao extremo, que tudo possa servir para punir a mínima coisa; que cada indivíduo se encontre preso numa universalidade punível-punidora.
Pela palavra punição, deve-se compreender tudo o que é capaz de fazer as crianças sentir a falta que cometeram, tudo o que é capaz de humilhá-las, de confundi-las: …uma certa frieza, uma certa indiferença, uma pergunta, uma humilhação, uma destituição de posto (13).
19 – 2) Mas a disciplina traz consigo uma maneira específica de punir, e que é apenas um modelo reduzido do tribunal. O que pertence à penalidade disciplinar é a inobservância, tudo o que está inadequado à regra, tudo o que se afasta dela, os desvios. É passível de pena o campo indefinido do não-conforme: o soldado comete uma “falta” cada vez que não atinge o nível requerido; a “falta” do aluno é, assim como um delito menor, uma inaptidão a cumprir suas tarefas. O regulamento da infantaria prussiana impunha tratar com “todo o rigor possível” o soldado que não tivesse aprendido a manejar corretamente o fuzil. Do mesmo modo,
quando um escolar não tiver guardado o catecismo da véspera, poder-se-á obrigá-lo a aprender o daquele dia, sem nenhum erro, e deverá repeti-lo no dia seguinte; ou será obrigado a ouvi-lo de pé ou de joelhos, ou com as mãos postas, ou então lhe será imposta alguma outra penitência.
20 – A ordem que os castigos disciplinares devem fazer respeitar é de natureza mista: é uma ordem “artificial”, colocada de maneira explícita por uma lei, um programa, um regulamento. Mas é também uma ordem, definida por processos naturais e observáveis: a duração de um aprendizado, o tempo de um exercício, o nível de aptidão têm por referência uma regularidade, que é também uma regra. As crianças das escolas cristãs nunca devem ser colocadas numa “lição” de que ainda não são capazes, pois estariam correndo o perigo de não poder aprender nada; entretanto a duração de cada estágio é fixada de maneira regulamentar e quem, no fim de três meses, não houver passado para a ordem superior deve ser colocado, bem em evidência, no banco dos “ignorantes”. A punição em regime disciplinar comporta uma dupla referência jurídico-natural.
21 – 3) O castigo disciplinar tem a função de reduzir os desvios. Deve portanto ser essencialmente corretivo. Ao lado das punições copiadas ao modelo judiciário (multas, açoite, masmorra), os sistemas disciplinares privilegiam as punições que são da ordem do exercício — aprendizado intensificado, multiplicado, muitas vezes repetido: o regulamento de 1766 para a infantaria previa que os soldados de primeira classe “que mostrarem alguma negligência ou má vontade serão enviados para a última classe”, e só poderão voltar à primeira, depois de novos exercícios e um novo exame, Como dizia, por seu lado, J.-B. de La Salle:
O castigo escrito é, de todas as penitências, a mais honesta para um mestre, a mais vantajosa e a que mais agrada aos pais; [permite] tirar dos próprios erros das crianças maneiras de avançar seus progressos corrigindo-lhes os defeitos; [àqueles, por exemplo], que não houverem escrito tudo o que deviam escrever, ou não se aplicarem para fazê-lo bem, se poderá dar algum dever para escrever ou para decorar (14).
22 – A punição disciplinar é, pelo menos por uma boa parte, isomorfa à própria obrigação; ela é menos a vingança da lei ultrajada que sua repetição, sua insistência redobrada. De modo que o efeito corretivo que dela se espera apenas de uma maneira acessória passa pela expiação e pelo arrependimento; é diretamente obtido pela mecânica de um castigo. Castigar é exercitar.
23 – 4) A punição, na disciplina, não passa de um elemento de um sistema duplo: gratificação-sanção. E é esse sistema que se torna operante no processo de treinamento e de correção. O professor
deve evitar, tanto quanto possível, usar castigos; ao contrário, deve procurar tornar as recompensas mais freqüentes que as penas, sendo os preguiçosos mais incitados pelo desejo de ser recompensados como os diligentes que pelo receio dos castigos; por isso será muito proveitoso, quando o mestre for obrigado a usar de castigo, que ele ganhe, se puder, o coração da criança, antes de aplicar-lhe o castigo (15).
24 – Este mecanismo de dois elementos permite um certo número de operações características da penalidade disciplinar. Em primeiro lugar, a qualificação dos comportamentos e dos desempenhos a partir de dois valores opostos do bem e do mal; em vez da simples separação do proibido, como é feito pela justiça penal, temos uma distribuição entre pólo positivo e pólo negativo; todo o comportamento cai no campo das boas e das más notas, dos bons e dos maus pontos. É possível, além disso, estabelecer uma quantificação e uma economia traduzida em números. Uma contabilidade penal, constantemente posta em dia, permite obter o balanço positivo de cada um. A “justiça” escolar levou muito longe esse sistema, de que se encontram pelo menos os rudimentos no exército ou nas oficinas. Os irmãos das Escolas Cristãs haviam organizado uma micro-economia dos privilégios e dos castigos escritos:
Os privilégios servirão aos escolares para se isentarem das penitências que lhes serão impostas… Um escolar por exemplo terá por castigo quatro ou cinco perguntas do catecismo para copiar; ele poderá se libertar dessa penitência mediante alguns pontos de privilégios; o mestre anotará o número para cada pergunta… Valendo os privilégios um número determinado de pontos, o mestre tem também outros de menor valor, que servirão como que de troco para os primeiros. Uma criança, por exemplo, terá um castigo de que se poderá redimir com seis pontos; tem um privilégio de dez; apresenta-o ao mestre que lhe devolve quatro pontos; e assim outros (16).
25 – E pelo jogo dessa quantificação, dessa circulação dos adiantamentos e das dívidas, graças ao cálculo permanente das notas a mais ou a menos, os aparelhos disciplinares hierarquizam, numa relação mútua, os “bons” e os “maus” indivíduos. Através dessa microeconomia de uma penalidade perpétua, opera-se uma diferenciação que não é a dos atos, mas dos próprios indivíduos, de sua natureza, de suas virtualidades, de seu nível ou valor. A disciplina, ao sancionar os atos com exatidão, avalia os indivíduos “com verdade”; a penalidade que ela põe em execução se integra no ciclo de conhecimento dos indivíduos.
26 – 5) A divisão segundo as classificações ou os graus tem um duplo papel: marcar os desvios, hierarquizar as qualidades, as competências e as aptidões; mas também castigar e recompensar. Funcionamento penal da ordenação e caráter ordinal da sanção. A disciplina recompensa unicamente pelo jogo das promoções que permitem hierarquias e lugares; pune rebaixando e degradando. O próprio sistema de classificação vale como recompensa ou punição. Havia sido aperfeiçoado na Escola Militar um sistema complexo de hierarquização “honorífica”, em que as roupas traduziam essa classificação aos olhos de todos, e castigos mais ou menos nobres ou vergonhosos estavam ligados, como marca de privilégio ou de infâmia, às categorias assim distribuídas. Essa repartição classificatória e penal se efetua a intervalos próximos por relatórios que os oficiais, os professores, seus adjuntos fazem, sem consideração de idade ou de posto, sobre “as qualidades morais dos alunos” e sobre “seu comportamento universalmente reconhecido”. A primeira classe, dita dos “muito bons”, se distingue por uma dragona de prata; sua honra é ser tratada como “uma tropa puramente militar”; militares serão portanto as punições a que ela tem direito (as detenções e, nos casos graves, a prisão). A segunda classe, dos “bons”, usa uma dragona de seda cor de papoula e prata; são passíveis de prisão e detenção, e também da jaula e de se ajoelhar. A classe dos “medíocres” tem direito a uma dragona de lã vermelha; às penas precedentes se acrescenta, se for o caso, o burel. A última classe, a dos “maus”, é marcada por uma dragona de lã parda; “os alunos desta classe serão submetidos a todas as punições usuais no “Hotel” ou todas as que se julgar necessário introduzir, e até à masmorra escura”. A isso se acrescentou durante algum tempo a classe “vergonhosa” para a qual se prepararam regulamentos especiais “de maneira que os que a compõem estarão sempre separados dos outros e vestidos de burel”. Como só o mérito e o comportamento devem decidir sobre o lugar do aluno, “os das duas últimas classes poderão se orgulhar de subir às primeiras e usar suas marcas, quando, por testemunhos universais, se reconhecerá que se tornaram dignos disso pela mudança de seu comportamento e seus progressos; e os das primeiras classes também descerão para as outras se relaxarem e se relatórios reunidos e desvantajosos mostrarem que não merecem mais as distribuições e prerrogativas das primeiras classes…”. A classificação que pune deve tender a se extinguir. A “classe vergonhosa” só existe para desaparecer: “A fim de julgar a espécie de conversão dos alunos da classe vergonhosa que nela se comportam bem”, eles serão reintroduzidos nas outras classes, suas roupas lhes serão devolvidas; mas ficarão com seus camaradas de infâmia durante as refeições e as recreações; aí permanecerão se não continuarem a se comportar bem; daí “sairão absolutamente, se derem satisfação tanto nessa classe quanto nessa divisão” (17). Duplo efeito conseqüentemente dessa penalidade hierarquizante: distribuir os alunos segundo suas aptidões e seu comportamento, portanto segundo o uso que se poderá fazer deles quando saírem da escola; exercer sobre eles uma pressão constante, para que se submetam todos ao mesmo modelo, para que sejam obrigados todos juntos “à subordinação, à docilidade, à atenção nos estudos e nos exercícios, e à exata prática dos deveres e de todas as partes da disciplina”. Para que, todos, se pareçam.
27 – Em suma, a arte de punir, no regime do poder disciplinar, não visa nem a expiação, nem mesmo exatamente a repressão. Põe em funcionamento cinco operações bem distintas: relacionar os atos, os desempenhos, os comportamentos singulares a um conjunto, que é ao mesmo tempo campo de comparação, espaço de diferenciação e princípio de uma regra a seguir. Diferenciar os indivíduos em relação uns aos outros e em função dessa regra de conjunto — que se deve fazer funcionar como base mínima, como média a respeitar ou como o ótimo de que se deve chegar perto. Medir em termos quantitativos e hierarquizar em termos de valor as capacidades, o nível, a “natureza” dos indivíduos. Fazer funcionar, através dessa medida “valorizadora”, a coação de uma conformidade a realizar. Enfim traçar o limite que definirá a diferença em relação a todas as diferenças, a fronteira externa do anormal (a “classe vergonhosa” da Escola Militar). A penalidade perpétua que atravessa todos os pontos e controla todos os instantes das instituições disciplinares compara, diferencia, hierarquiza, homogeniza, exclui. Em uma palavra, ela normaliza.
28 – Opõe-se então termo por termo a uma penalidade judiciária que tem a função essencial de tomar por referência, não um conjunto de fenômenos observáveis, mas um corpo de leis e de textos que é preciso memorizar; não diferenciar indivíduos, mas especificar atos num certo número de categorias gerais; não hierarquizar mas fazer funcionar pura e simplesmente a oposição binária do permitido e do proibido; não homogeneizar, mas realizar a partilha, adquirida de uma vez por todas, da condenação. Os dispositivos disciplinares produziram uma “penalidade da norma” que é irredutível em seus princípios e seu funcionamento à penalidade tradicional da lei. O pequeno tribunal que parece ter sede permanente nos edifícios da disciplina, e às vezes toma a forma teatral do grande aparelho judiciário, não deve iludir: ele não conduz, a não ser por algumas continuidades formais, os mecanismos da justiça criminal até à trama da existência cotidiana; ou ao menos não é isso o essencial; as disciplinas inventaram — apoiando-se aliás sobre uma série de processos muito antigos — um novo funcionamento punitivo, e é este que pouco a pouco investiu o grande aparelho exterior que parecia reproduzir modesta ou ironicamente. O funcionamento jurídico-antropológico que toda a história da penalidade moderna revela não se origina na superposição à justiça criminal das ciências humanas, e nas exigências próprias a essa nova racionalidade ou ao humanismo que ela traria consigo; ele tem seu ponto de formação nessa técnica disciplinar que fez funcionar esses novos mecanismos de sanção normalizadora.
29 – Aparece, através das disciplinas, o poder da Norma. Nova lei da sociedade moderna? Digamos antes que desde o século 18 ele veio unir-se a outros poderes obrigando-os a novas delimitações; o da Lei, o da Palavra e do Texto, o da Tradição. O Normal se estabelece como princípio de coerção no ensino, com a instauração de uma educação estandardizada e a criação das escolas normais; estabelece-se no esforço para organizar um corpo médico e um quadro hospitalar da nação capazes de fazer funcionar normas gerais de saúde; estabelece-se na regularização dos processos e dos produtos industriais (18). Tal como a vigilância e junto com ela, a regulamentação é um dos grandes instrumentos de poder no fim da era clássica. As marcas que significavam status, privilégios, filiações, tendem a ser substituídas ou pelo menos acrescidas de um conjunto de graus de normalidade, que são sinais de filiação a um corpo social homogêneo, mas que têm em si mesmos um papel de classificação, de hierarquização e de distribuição de lugares. Em certo sentido, o poder de regulamentação obriga à homogeneidade; mas individualiza, permitindo medir os desvios, determinar os níveis, fixar as especialidades e tornar úteis as diferenças, ajustando-as umas às outras. Compreende-se que o poder da norma funcione facilmente dentro de um sistema de igualdade formal, pois dentro de uma homogeneidade que é a regra, ele introduz, como um imperativo útil e resultado de uma medida, toda a gradação das diferenças individuais.
O EXAME
30 – O exame combina as técnicas da hierarquia que vigia e as da sanção que normaliza. É um controle normalizante, uma vigilância que permite qualificar, classificar e punir. Estabelece sobre os indivíduos uma visibilidade através da qual eles são diferenciados e sancionados. É por isso que, em todos os dispositivos de disciplina, o exame é altamente ritualizado. Nele vêm-se reunir a cerimônia do poder e a forma da experiência, a demonstração da força e o estabelecimento da verdade. No coração dos processos de disciplina, ele manifesta a sujeição dos que são percebidos como objetos e a objetivação dos que se sujeitam. A superposição das relações de poder e das de saber assume no exame todo o seu brilho visível. Mais uma inovação da era clássica que os historiadores deixaram na sombra. Faz-se a história das experiências com cegos de nascença, meninos-lobo ou com a hipnose. Mas quem fará a história mais geral, mais vaga, mais determinante também, do “exame” — de seus rituais, de seus métodos, de seus personagens e seus papéis, de seus jogos de perguntas e respostas, de seus sistemas de notas e de classificação? Pois nessa técnica delicada estão comprometidos todo um campo de saber, todo um tipo de poder. Fala-se muitas vezes da ideologia que as “ciências” humanas pressupõem, de maneira discreta ou declarada. Mas sua própria tecnologia, esse pequeno esquema operatório que tem tal difusão (da psiquiatria à pedagogia, do diagnóstico das doenças à contratação de mão-de-obra), esse processo tão familiar do exame, não põe em funcionamento, dentro de um só mecanismo, relações de poder que permitem obter e constituir saber? O investimento político não se faz simplesmente ao nível da consciência, das representações e no que julgamos saber, mas ao nível daquilo que torna possível algum saber.
31 – Uma das condições essenciais para a liberação epistemológica da medicina no fim do século 18 foi a organização do hospital como aparelho de “examinar”. O ritual da visita é uma de suas formas mais evidentes. No século 17, o médico, vindo de fora, juntava a sua inspeção vários outros controles — religiosos, administrativos; não participava absolutamente da gestão cotidiana do hospital. Pouco a pouco a visita tornou-se mais regular, mais rigorosa, principalmente mais extensa: ocupou uma parte cada vez mais importante do funcionamento hospitalar. Em 1661, o médico do Hotel-Dieu de Paris era encarregado de uma visita por dia; em 1687, um médico “expectante” devia examinar, à tarde, certos doentes mais graves. Os regulamentos do século XVIII determinam os horários da visita, e sua duração (duas horas no mínimo); insistem para que um rodízio permita que seja realizado todos os dias “inclusive domingo de Páscoa”; enfim em 1771 institui-se um médico residente, encarregado de “prestar todos os serviços de seu estado, tanto de noite como de dia, nos intervalos entre uma visita e outra de um médico de fora” (19). A inspeção de antigamente, descontínua e rápida, se transforma em uma observação regular que coloca o doente em situação de exame quase perpétuo. Com duas conseqüências: na hierarquia interna, o médico, elemento até então exterior, começa a suplantar o pessoal religioso e a lhe confiar um papel determinado mas subordinado, na técnica do exame; aparece então a categoria do “enfermeiro”; quanto ao próprio hospital, que era antes de tudo um local de assistência, vai tornar- se local de formação e aperfeiçoamento científico: viravolta das relações de poder e constituição de um saber. O hospital bem “disciplinado” constituirá o local adequado da “disciplina” médica; esta poderá então perder seu caráter textual e encontrar suas referências menos na tradição dos autores decisivos que num campo de objetos perpetuamente oferecidos ao exame.
32 – Do mesmo modo, a escola torna-se uma espécie de aparelho de exame ininterrupto que acompanha em todo o seu comprimento a operação do ensino. Tratar-se-á cada vez menos daquelas justas em que os alunos defrontavam forças e cada vez mais de uma comparação perpétua de cada um com todos, que permite ao mesmo tempo medir e sancionar. Os Irmãos das Escolas Cristãs queriam que seus alunos fizessem provas de classificação todos os dias da semana: o primeiro dia para a ortografia, o segundo para a aritmética, o terceiro para o catecismo da manhã, e de tarde para a caligrafia, etc. Além disso, devia haver uma prova todo mês, para designar os que merecessem ser submetidos ao exame do inspetor (20). Desde 1775, há na escola de Ponts et Chaussées 16 exames por ano: 3 de matemática, 3 de arquitetura, 3 de desenho, 2 de caligrafia, 1 de corte de pedras, 1 de estilo, 1 de levantamento de planta, 1 de nivelamento, 1 de medição de edifícios (21). O exame não se contenta em sancionar um aprendizado; é um de seus fatores permanentes: sustenta-o segundo um ritual de poder constantemente renovado. O exame permite ao mestre, ao mesmo tempo em que transmite seu saber, levantar um campo de conhecimentos sobre seus alunos. Enquanto que a prova com que terminava um aprendizado na tradição corporativa validava uma aptidão adquirida — a “obra- prima” autentificava uma transmissão de saber já feita — o exame é na escola uma verdadeira e constante troca de saberes: garante a passagem dos conhecimentos do mestre ao aluno, mas retira do aluno um saber destinado e reservado ao mestre. A escola torna-se o local de elaboração da pedagogia. E do mesmo modo como o processo do exame hospitalar permitiu a liberação epistemológica da medicina, a era da escola “examinatória” marcou o início de uma pedagogia que funciona como ciência. A era das inspeções e das manobras indefinidamente repetidas, no exército, marcou também o desenvolvimento de um imenso saber tático que teve efeito na época das guerras napoleônicas.
33 – O exame supõe um mecanismo que liga um certo tipo de formação de saber a uma certa forma de exercício do poder.
34 – 1) O exame inverte a economia da visibilidade no exercício do poder: tradicionalmente, o poder é o que se vê, se mostra, se manifesta e, de maneira paradoxal, encontra o princípio de sua força no movimento com o qual a exibe. Aqueles sobre o qual ele é exercido podem ficar esquecidos; só recebem luz daquela parte do poder que lhes é concedida, ou do reflexo que mostram um instante. O poder disciplinar, ao contrário, se exerce tornando-se invisível: em compensação impõe aos que submete um princípio de visibilidade obrigatória. Na disciplina, são os súditos que têm que ser vistos. Sua iluminação assegura a garra do poder que se exerce sobre eles. É o fato de ser visto sem cessar, de sempre poder ser visto, que mantém sujeito o indivíduo disciplinar. E o exame é a técnica pela qual o poder, em vez de emitir os sinais de seu poderio, em vez de impor sua marca a seus súditos, capta-os num mecanismo de objetivação. No espaço que domina, o poder disciplinar manifesta, para o essencial, seu poderio organizando os objetos. O exame vale como cerimônia dessa objetivação.
35 – Até então o papel da cerimônia política fora dar lugar à manifestação ao mesmo tempo excessiva e regulamentada do poder; era uma expressão suntuosa de poderio, uma “despesa” ao mesmo tempo exagerada e codificada onde o poder se revigorava. Era sempre mais ou menos aparentada ao triunfo. A aparição solene do soberano trazia consigo qualquer coisa da consagração do coroamento, do retorno da vitória; até mesmo os faustos funerários se desenrolavam no brilho do poderio exibido. Já a disciplina tem seu próprio tipo de cerimônia. Não é o triunfo, é a revista, é a “parada”, forma faustosa do exame. Os “súditos” são aí oferecidos como “objetos” à observação de um poder que só se manifesta pelo olhar. Não recebem diretamente a imagem do poderio soberano; apenas mostram seus efeitos — e por assim dizer em baixo relevo — sobre seus corpos tornados exatamente legíveis e dóceis. Em 15 de março de 1666, Luís XIV passa sua primeira revista militar: 18.000 homens, “uma das ações mais brilhantes do reino”, e que passava por ter “mantido toda a Europa inquieta”. Muitos anos depois, foi cunhada uma medalha para comemorar o acontecimento (22). Traz, no exergo: Disciplina militaris restituta e na legenda: Prolusio ad victorias. À direita, o rei, com o pé direito para a frente, comanda ele próprio o exercício com um bastão. Na metade esquerda, várias fileiras de soldados são vistos de frente, e alinhados no sentido da profundidade; eles estendem o braço na altura do ombro e seguram o fuzil exatamente na vertical: avançam a perna direita e estão com o pé esquerdo voltado para fora. No chão, linhas se cortam em ângulo reto, representando, sob os pés dos soldados, grandes quadrados que servem de referência para as diversas fases e posições do exercício. Bem no fundo, esboça-se uma arquitetura clássica. As colunas do palácio prolongam as constituídas pelos homens alinhados e pelos fuzis levantados, como as lajes do calçamento prolongam as linhas do exercício. Mas acima da balaustrada que coroa o edifício, estátuas representam personagens que dançam: linhas sinuosas, gestos arredondados, cortinados. O mármore é percorrido por movimentos, cujo princípio de unidade é harmônico. Já os homens estão imobilizados numa atitude uniformemente repetida de fileira em fileira e de linha em linha: unidade tática. A ordem da arquitetura, que liberta em seu topo as figuras de dança, impõe no solo suas regras e geometria aos homens disciplinados. As colunas do poder. “Bem”, dizia um dia o grão-duque Michel diante de quem as tropas haviam acabado de manobrar, “mas eles estão respirando” (23).
36 – Tomemos essa medalha como testemunho do momento em que se reúnem de maneira paradoxal mas significativa a figura mais brilhante do poder soberano e a emergência dos rituais próprios ao poder disciplinar. A visibilidade mal sustentável do monarca se torna em visibilidade inevitável dos súditos. E essa inversão de visibilidade no funcionamento das disciplinas é que realizará o exercício do poder até em seus graus mais baixos. Entramos na era do exame interminável e da objetivação limitadora.
37 – 2) O exame faz também a individualidade entrar num campo documentário: Seu resultado é um arquivo inteiro com detalhes e minúcias que se constitui ao nível dos corpos e dos dias. O exame que coloca os indivíduos num campo de vigilância situa-os igualmente numa rede de anotações escritas; compromete-os em toda uma quantidade de documentos que os captam e os fixam. Os procedimentos de exame são acompanhados imediatamente de um sistema de registro intenso e de acumulação documentária. Um “poder de escrita” é constituído como uma peça essencial nas engrenagens da disciplina. Em muitos pontos, modela-se pelos métodos tradicionais da documentação administrativa. Mas com técnicas particulares e inovações importantes. Umas se referem aos métodos de identificação, de assimilação, ou de descrição. Era esse o problema do exército, onde urgia encontrar os desertores, evitar as convocações repetidas, corrigir as listas fictícias apresentadas pelos oficiais, conhecer os serviços e o valor de cada um, estabelecer com segurança o balanço dos desaparecidos e mortos. Era esse o problema dos hospitais, onde era preciso reconhecer os doentes, expulsar os simuladores, acompanhar a evolução das doenças, verificar a eficácia dos tratamentos, descobrir os casos análogos e os começos de epidemias. Era o problema dos estabelecimentos de ensino, onde era forçoso caracterizar a aptidão de cada um, situar seu nível e capacidades, indicar a utilização eventual que se pode fazer dele.
A função do registro é fornecer indicações de tempo e lugar, dos hábitos das crianças, de seu progresso na piedade, no catecismo, nas letras de acordo com o tempo na Escola, seu espírito e critério que ele encontrará marcado desde sua recepção (24).
38 – Daí a formação de uma série de códigos da individualidade disciplinar que permitem transcrever, homogeneizando-os, os traços individuais estabelecidos pelo exame: código físico da qualificação, código médico dos sintomas, código escolar ou militar dos comportamentos e dos desempenhos. Esses códigos eram ainda muito rudimentares, em sua forma qualitativa ou quantitativa, mas marcam o momento de uma primeira “formalização” do individual dentro de relações do poder.
39 – As outras inovações da escrita disciplinar se referem à correlação desses elementos, à acumulação dos documentos, sua seriação, à organização de campos comparativos que permitam classificar, formar categorias, estabelecer médias, fixar normas. Os hospitais do século 18 foram particularmente grandes laboratórios para os métodos escriturários e documentários. A manutenção dos registros, sua especificação, os modos de transcrição de uns para os outros, sua circulação durante as visitas, sua confrontação durante as reuniões regulares dos médicos e dos administradores, a transmissão de seus dados a organismos de centralização (ou no hospital ou no escritório central dos serviços hospitalares), a contabilidade das doenças, das curas, dos falecimentos ao nível de um hospital de uma cidade e até da nação inteira fizeram parte integrante do processo pelo qual os hospitais foram submetidos ao regime disciplinar. Entre as condições fundamentais de uma boa “disciplina” médica nos dois sentidos da palavra, é preciso incluir os processos de escrita que permitem integrar, mas sem que se percam, os dados individuais em sistemas cumulativos; fazer de maneira que a partir de qualquer registro geral se possa encontrar um indivíduo e que inversamente cada dado do exame individual possa repercutir nos cálculos de conjunto.
40 – Graças a todo esse aparelho de escrita que o acompanha, o exame abre duas possibilidades que são correlatas: a constituição do indivíduo como objeto descritível, analisável, não contudo para reduzi-lo a traços “específicos”, como fazem os naturalistas a respeito dos seres vivos; mas para mantê-lo em seus traços singulares, em sua evolução particular, em suas aptidões ou capacidades próprias, sob o controle de um saber permanente; e por outro lado a constituição de um sistema comparativo que permite a medida de fenômenos globais, a descrição de grupos, a caracterização de fatos coletivos, a estimativa dos desvios dos indivíduos entre si, sua distribuição numa “população”.
41 – Importância decisiva, consequentemente, dessas pequenas técnicas de anotação, de registro, de constituição de processos, de colocação em colunas que nos são familiares mas que permitiram a liberação epistemológica das ciências do indivíduo. Sem dúvida temos razão em colocar o problema aristotélico: é possível uma ciência do indivíduo, e legítima? Para um grande problema, grandes soluções talvez. Mas há o pequeno problema histórico da emergência, pelo fim do século 18, do que se poderia colocar sob a sigla de ciências “clínicas”; problema da entrada do indivíduo (e não mais da espécie) no campo do saber; problema da entrada de descrição singular, do interrogatório, da anamnese, do “processo” no funcionamento geral do discurso científico. Para essa simples questão de fato, é preciso sem dúvida uma resposta sem grandeza: é preciso ver o lado desses processos de escrita e de registro; é preciso ver o lado dos mecanismos de exame, o lado da formação dos dispositivos de disciplina e da formação de um novo tipo de poder sobre os corpos. O nascimento das ciências do homem? Aparentemente ele deve ser procurado nesses arquivos de pouca glória onde foi elaborado o jogo moderno das coerções sobre os corpos, os gestos, os comportamentos.
42 – 3) O exame, cercado de todas as suas técnicas documentárias, faz de cada indivíduo um “caso”: um caso que ao mesmo tempo constitui um objeto para o conhecimento e uma tomada para o poder. O caso não é mais, como na casuística ou na jurisprudência, um conjunto de circunstâncias que qualificam um ato e podem modificar a aplicação de uma regra, é o indivíduo tal como pode ser descrito, mensurado, medido, comparado a outros e isso em sua própria individualidade; e é também o indivíduo que tem que ser treinado ou retreinado, tem que ser classificado, normalizado, excluído, etc.
43 – Durante muito tempo a individualidade qualquer — a de baixo e de todo mundo — permaneceu abaixo do limite de descrição. Ser olhado, observado, contado detalhadamente, seguido dia por dia por uma escrita ininterrupta era um privilégio. A crônica de um homem, o relato de sua vida, sua historiografia redigida no desenrolar de sua existência faziam parte dos rituais do poderio. Os procedimentos disciplinares reviram essa relação, abaixando o limite da individualidade descritível e fazem dessa descrição um meio de controle e um método de dominação. Não mais monumento para uma memória futura, mas documento para uma utilização eventual. E essa nova descritibilidade é ainda mais marcada, porquanto é estrito o enquadramento disciplinar: a criança, o doente, o louco, o condenado se tornarão, cada vez mais facilmente a partir do século 18 e segundo uma via que é a dos mecanismos de disciplina, objeto de descrições individuais e de relatos biográficos. Esta transcrição por escrito das existências reais não é mais um processo de heroificação; funciona como processo de objetivação e de sujeição. A vida cuidadosamente estudada dos doentes mentais ou dos delinquentes se origina, como a crônica dos reis ou a epopeia dos grandes bandidos populares, de uma certa função política da escrita, mas numa técnica de poder totalmente diversa.
44 – O exame como fixação ao mesmo tempo ritual e “científica” das diferenças individuais, como aposição de cada um à sua própria singularidade (em oposição à cerimônia onde se manifestam os status, os nascimentos, os privilégios, as funções, com todo o brilho de suas marcas) indica bem a aparição de uma nova modalidade de poder em que cada um recebe como status sua própria individualidade, e onde está estatutariamente ligado aos traços, às medidas, aos desvios, às “notas” que o caracterizam e fazem dele, de qualquer modo, um “caso”.
45 – Finalmente, o exame está no centro dos processos que constituem o indivíduo como efeito e objeto de poder, como efeito e objeto de saber. É ele que, combinando vigilância hierárquica e sanção normalizadora, realiza as grandes funções disciplinares de repartição e classificação, de extração máxima das forças e do tempo, de acumulação genética contínua, de composição ótima das aptidões. Portanto, de fabricação da individualidade celular, orgânica, genética e combinatória. Com ele se ritualizam aquelas disciplinas que se pode caracterizar com uma palavra dizendo que são uma modalidade de poder para o qual a diferença individual é pertinente.
46 – As disciplinas marcam o momento em que se efetua o que se poderia chamar a troca do eixo político da individualização. Nas sociedades de que o regime feudal é apenas um exemplo, pode-se dizer que a individualização é máxima do lado em que a soberania é exercida e nas regiões superiores do poder. Quanto mais o homem é detentor de poder ou de privilégio, tanto mais é marcado como indivíduo, por rituais, discursos, ou representações plásticas. O “nome de família” e a genealogia que situam, dentro de um conjunto de parentes, a realização de proezas que manifestam a superioridade das forças e que são imortalizadas por relatos, as cerimônias que marcam, por sua ordenação, as relações de poder, os monumentos ou as doações que dão uma outra vida depois da morte, os faustos e os excessos da despesa, os múltiplos laços de vassalagem e de suserania que se entrecruzam, tudo isso constitui outros procedimentos de uma individualização “ascendente”. Num regime disciplinar, a individualização, ao contrário, é “descendente” à medida que o poder se torna mais anônimo e mais funcional, aqueles sobre os quais se exerce tendem a ser mais fortemente individualizados; e por fiscalizações mais que por cerimônias, por observações mais que por relatos comemorativos, por medidas comparativas que têm a “norma” como referência, e não por genealogias que dão os ancestrais como pontos de referência; por “desvios” mais que por proezas. Num sistema de disciplina, a criança é mais individualizada que o adulto, o doente o é antes do homem são, o louco e delinquente mais que o normal e o não-delinqüente. É em direção aos primeiros, em todo caso, que se voltam em nossa civilização todos os mecanismos individualizantes; e quando se quer individualizar o adulto são, normal e legalista, agora é sempre perguntando-lhe o que ainda há nele de criança, que loucura secreta o habita, que crime fundamental ele quis cometer. Todas as ciências, análises ou práticas com radical “psico”, têm seu lugar nessa troca histórica dos processos de individualização. O momento em que passamos de mecanismos histórico-rituais de formação da individualidade a mecanismos científico-disciplinares, em que o normal tomou o lugar do ancestral, e a medida o lugar do status, substituindo assim a individualidade do homem memorável pela do homem calculável, esse momento em que as ciências do homem se tornaram possíveis, é aquele em que foram postas em funcionamento uma nova tecnologia do poder e uma outra anatomia política do corpo. E se da Idade Média mais remota até hoje a “aventura” é o relato da individualidade, a passagem do épico ao romanesco, do feito importante à singularidade secreta, dos longos exílios à procura interior da infância, das justas aos fantasmas, se insere também na formação de uma sociedade disciplinar. São as desgraças do pequeno Hans e não mais “o bom Henriquinho” que contam a aventura de nossa infância. O Roman de La Rose é escrito hoje em dia por Mary Barnes; no lugar de Lancelot, o presidente Schreber.
47 – Muitas vezes se afirma que o modelo de uma sociedade que teria indivíduos como elementos constituintes é tomada às formas jurídicas abstratas do contrato e da troca. A sociedade comercial se teria representado como uma associação contratual de sujeitos jurídicos isolados. Talvez. A teoria política dos séculos 17 e 18 parece com efeito obedecer a esse esquema. Mas não se deve esquecer que existiu na mesma época uma técnica para constituir efetivamente os indivíduos como elementos correlates de um poder e de um saber. O indivíduo é sem dúvida o átomo fictício de uma representação “ideológica” da sociedade; mas é também uma realidade fabricada por essa tecnologia específica de poder que se chama a “disciplina”. Temos que deixar de descrever sempre os efeitos de poder em termos negativos: ele “exclui”, “reprime”, “recalca”, “censura”, “abstrai”, “mascara”, “esconde”. Na verdade o poder produz; ele produz realidade; produz campos de objetos e rituais da verdade. O indivíduo e o conhecimento que dele se pode ter se originam nessa produção.
48 – Mas emprestar tal poderio às astúcias muitas vezes minúsculas da disciplina, não seria lhes conceder muito? De onde podem elas tirar tão vastos efeitos?
NOTAS
1. J.J. Walhausen, L’Art militaire pour l’infanterie, 1615, p. 23.
2. Règlement pour Pinfanterie prussienne, trad. Franc, Arsenal, Ms. 1067, f. 144. Para os esquemas antigos, ver Praissac, Les discours militaires, 1623m, p. 27-28. Montgommery, La milice française, p. 77. Para os novos esquemas, cf. Beneton de Morange, Histoire de la guerre, 1741, p. 61-64, e Dissertations sur les Tentes; cf. também vários regulamentos como a Instruction sur le service des règlements de Cavalerie dans les camps, 29 de junho de 1753. Ver ilustração n° 7.
3. Citado em R. Laulan, L’École militaire de Paris, 1950, p. 117-118.
4. Arch. Nat. MM 666-669. J. Bentham conta que foi visitando a Escola Militar que seu irmão teve a primeira ideia do Panopticon.
5. Ver ilustrações nos 12, 13, 16.
6. Encyclopédie, artigo “Manufacture”.
7. Cournol, Considérations d’intérêt public sur le droit d’exploiter les mines, 1790, Arqu. Nac, A. XIII, 14.
8. Cf. K. Marx: “Essa função de vigilância, de direção e de mediação toma-se a função do capital, assim que O trabalho que lhe é subordinado se torna cooperativo, e como função capitalista ela adquire características especiais” (O Capital, livro I, quarta seção, cap. XIII).
9. M.I.D.B., Instruction méthodique pour 1’école paroissiale, 1669, p. 68-83.
10. Ch. Demia, Règlement pour les écoles de la ville de Lyon, 1716, p. 27-29. Poderíamos notar um fenômeno do mesmo gênero na organização dos colégios: durante muito tempo os “prefeitos” eram, independentemente dos professores, encarregados da responsabilidade moral dos pequenos grupos de alunos. Depois de 1762, principalmente, vemos aparecer um tipo de controle ao mesmo tempo mais administrativo e mais integrado à hierarquia: fiscais, mestres de bairro, mestres subalternos. Cf. Dupont-Ferrier, Du colège de Clermont au lycée Louisle-Grand, vol. I, p. 254 e 476.
11. Pictet de Rochemont, Journal de Genève, 5 de janeiro de 1788.
12. Regulamento provisório para a fábrica de M. Oppenheim, 29 de setembro de 1809.
13. J.B. de la Salle, Conduite des Écoles chrétiennes (1828), p. 204-205.
14. Ibidem.
15. Ch. Demia, Règlement pour les écoles de la ville de Lyon, 1716, p. 17.
16. J.-B. de la Salle, Conduite des Écoles chrétiennes, B.N., Ms. 11759, p. 156s. Temos aí a transposição do sistema das indulgências.
17. Archives nationales, MM 658, 30 de março de 1758, e MM 666, 15 de setembro de 1763.
18. Sobre esse ponto é necessário se reportar às páginas essenciais de G. Canguilhem, Le normal et le pathologique, ed. de 1866, p. 171-191.
19. Registre des délibérations du bureau de l’Hôtel-Dieu.
20. J.-B. de La Salle, Conduite des Écoles chrétiennes, 1828, p. 160.
21. Cf. L’Enseignement et la diffusion des sciences au XVIIIe, 1964, p. 360.
22. Sobre essa medalha, cf. o artigo de J. Jucquiot in Le Club français de la médaille, 4o trimestre de 1970, p. 50-54. Ver ilustração n° 2.
23. Kropotkine, Autour d’une vie, 1902, p, 9. Devo essa referência a M.G. Ganguilhem.
24. M.I.D.B., Instruction méthodique pour 1’école paroissiale, 1669, p. 64.
Fim do texto
DEVEMOS MELHORAR OU MUDAR A EDUCAÇÃO?
Para saber isso vamos conhecer as principais críticas feitas por pensadores da educação e refletir se nossas atividades estão sintonizadas com a mudança que está vindo, em especial agora que a sociedade está ficando mais interativa e com a inteligência artificial que vai se encarregar de muitas das tarefas que sempre foram executadas por nós. Mais um motivo para tentar descobrir quais são as características de uma aprendizagem tipicamente humana, que nunca poderá ser realizada por máquinas ou programas inteligentes.
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