A livre-aprendizagem na sociedade-em-rede

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A livre-aprendizagem na sociedade-em-rede

Eis o texto.

APRESENTAÇÃO

“O critério da pedagogia é só um: a liberdade”.

Leon TOLSTOI (1862): Da instrução popular, in Obras Pedagógicas.

Nada entendo de educação. Só por isso posso escrever este texto. Se precisasse ser aceito e reconhecido pelas comunidades de filósofos da educação, epistemólogos e pedagogos para dizer o que penso sobre o assunto, provavelmente não poderia fazê-lo. Este texto está sendo escrito durante oito anos. Comecei em 2010 e levei esse tempo todo para resumir aqui o que escrevi em muitos lugares e acrescentar os resultados preliminares de novas investigações que ando fazendo.

EM PRIMEIRO LUGAR começo dizendo que, em termos de aprendizagem, não pode existir nada como “a educação”. Existem inúmeros processos de aprendizagem, mas não uma (única) educação. Quando nos dizem que existe “a educação” é porque querem falar de ensino – e, não raro, do que se chamou de “instrução pública” – não propriamente de aprendizagem. Acharam que era preciso educar o povo, formatar a mente das massas, domesticar a besta-fera humana e outras porcarias semelhantes. Se você leu o Marquês de Condorcet (1792) e as obras pedagógicas de Tolstoi (1862) – sobretudo “Da Instrução Popular” – entenderá parcialmente o que estou dizendo. Se você ficou a par das críticas de Nietzsche (1888) e de Foucault (1975), entenderá um pouco mais. Mas talvez não tudo ainda.

EM SEGUNDO LUGAR afirmo que ensino não tem a ver com aprendizagem. É outra coisa. Se você diz: – Quero que você aprenda não o que você quer aprender e sim o que eu quero que você aprenda, então o nome disso é ensino. O Homo Sapiens vem aprendendo há mais ou menos 200 mil anos, mas o ensino só surgiu nos últimos 6 milênios. O ensino como instituição só surgiu quando se formou um estamento sacerdotal cuja função precípua era produzir artificialmente escassez. Esses clusters de burocratas, conformados por fora dos fluxos interativos da convivência social, não podiam se reproduzir pela própria dinâmica da vida em sociedade. Foi assim que inventaram o ensino. Ou seja, criaram um ensinamento (um corpo de conhecimento-morto, definido ex ante à interação) cuja transmissão assegurasse a reprodução do próprio estamento, que, de outro modo, desapareceria, posto que não produzia os meios necessários à sua sobrevivência (eles não trabalhavam, o que significa – já naquele contexto da sociedade hierárquica nascente – que eram sustentados por outrem).

O inesquecível Joseph Campbell, em As Máscaras de Deus (1959), nos deu uma pista preciosíssima sobre a origem do ensino. Mas do ensino como instituição, não o fato de alguém ensinar outra pessoa a fazer uma coisa, como colher arroz ou colocar palmilha num sapato, quer dizer, não o ensino de techné; nem mesmo o “ensino” sofista da retórica prática, dos modos de proferir a doxa; mas o ensino como transmissão de ensinamento supostamente verdadeiro, que tem a ver com a transmissão – se isso for possível – de episteme (no sentido original do termo). Então escreveu o velho Campbell que “de súbito, em uma data crucial que pode ser fixada quase com precisão em 3.200 a. C., surge naquela pequena região lodosa suméria… a criação factual e claramente consciente da mente e ciência de uma nova ordem de humanidade que jamais havia surgido na história da espécie humana: o profissional em tempo integral, iniciado e estritamente arregimentado, sacerdote de templo” (1).

Cinco mil anos depois, o mesmo processo continua, como reconheceu Rupert Sheldrake (1992), aquele investigador heterodoxo que tenta fazer outro tipo de ciência (embora não o reconheça): “Penso que é de fundamental importância reconhecer conscientemente que a educação é uma forma de iniciação… Os iniciados assemelham-se a um sacerdócio secular qualificado para dirigir e ordenar a sociedade. Das suas fileiras são recrutados nossos burocratas, cientistas, tecnocratas e intelectuais” (2).

Configurado um corpo docente, surgiu, portanto, o ensino. A definição de um ensinamento (um conteúdo protegido da interação para ser transfundido do docente ao discente) foi pura produção artificial de escassez: se o conhecimento não fosse escasso, mas estivesse acessível a todos, se uma pessoa pudesse aprender por si mesma (autodidatismo) ou aprender com seus amigos (alterdidatismo), não haveria necessidade de uma casta que o guardasse para transmiti-lo com exclusividade e autoridade (heterodidatismo). O ensino (heterodidata) é uma proteção contra a experiência da livre-aprendizagem (autodidata e alterdidata). Se quisermos ser mais incisivos podemos dizer que o ensino surgiu contra a aprendizagem. Se você leu Carl Rogers (1952) ou John Holt (1989) entenderá o que estou dizendo. Rogers chegou à conclusão de que “Devíamos renunciar ao ensino. As pessoas teriam de reunir-se se quisessem aprender” (3). E Holt escreveu: “Posso resumir em cinco ou sete palavras o que casualmente aprendi como professor. A versão de sete palavras é esta: ‘Aprender não é o produto de ensinar’. A versão de cinco palavras é esta: ‘O ensinar não produz aprendizagem'”(4).

Por meio do ensino a criança, simplesmente, torna-se sócia de um mundo interpretativo que deve replicar. Como escreveu Carlos Castaneda (1972), em Viagem a Ixtlan, a criança vira uma replicadora desse mundo “quando é capaz de fazer todas as interpretações perceptíveis adequadas que, conformando-se com aquela descrição que lhe foi inculcada, a revalidem” (5).

EM TERCEIRO LUGAR, quero observar que quando alguém fala em educação, as pessoas pensam logo – ou automaticamente – em escola porque, como todo mundo sabe, a escola é o lugar do ensino. Ou seja, elas acham que educação é basicamente ensino porque tomam aprendizagem por ensino. A escola seria assim uma espécie de fábrica da educação. É lá que as pessoas serão produzidas (formatadas) em série para reproduzir o modo-de-vida que caracteriza o que chamam de “a sociedade” (como se isso existisse). Como não existe “a sociedade” (e sim uma infinidade de sociosferas), do que se trata mesmo é de reproduzir o modo-de-vida de alguma deriva da civilização patriarcal. Se você leu Humberto Maturana (1982; 1993) entenderá o que estou dizendo. Maturana (1993) escreveu que “essa maneira de viver, no contínuo jogo da competição e da demanda de estabilidade, faz da educação um instrumento de criação de meninos e meninas patriarcais. Eles viverão em contradição emocional, pois o farão tanto na contínua negação da democracia como modo de coexistência humana, quanto na permanente nostalgia da recuperação de seus fundamentos matrísticos” (6).

A existência de escolas escolarizou a sociedade. Basta uma escola e uma educação estatal (dita pública) para transformar tudo em escola. O escolarizado é um escolarizador. Na cabeça de cada paciente da ensinagem é depositado o ovo de um demônio professoral. Mais cedo ou mais tarde esse ovo eclodirá e ele tenderá a transformar tudo que tocar – a empresa, a corporação, o partido, a ONG, o governo – em escola. Inclusive a escola… quando ele achar que a escola está em crise e tiver a má ideia de fazer uma nova escola, uma escola democrática, uma escola revolucionária. Continuará fazendo escola, quer dizer, escolarizando a sociedade. Se você leu Ivan Illich (1970) – em Desescolarizando a sociedade (pessimamente traduzido, no Brasil e em outros países como Sociedade Sem Escolas) – entenderá, em grande parte, o que estou dizendo. Por algum motivo, porém, Illich não faz tanto sucesso nos cursos de pedagogia. Um bom sinal para Illich, cuja proposta central não era desescolarizar a escola e sim desescolarizar a sociedade; ou seja, as escolas continuarão existindo enquanto quiserem e puderem. Façam-se votos que consigam se aggiornar e matar menos a criatividade humana. Mas como a aprendizagem tipicamente humana é tão surpreendente que pode acontecer até mesmo na escola, desescolarizar não é fazer uma guerra contra as escolas, não é destruir as escolas. Como disse Ivan Illich: “Desescolarizar significa abolir o poder de uma pessoa de obrigar outra a frequentar uma reunião. Também significa o direito de qualquer pessoa, de qualquer idade ou sexo, convocar uma reunião. Esse direito foi drasticamente diminuído pela institucionalização das reuniões. ‘Reunião’ significa originalmente o ato individual de juntar-se. Agora, significa o produto institucional de alguma agência”.

EM QUARTO LUGAR quero relatar uma descoberta pessoal que foi muito significativa (para mim, pelo menos): a de que aprendizagem nunca é para alguma coisa. A aprendizagem é a coisa. Então o fluxo interativo que nos faz aprendentes é a coisa a não ser perturbada, condicionada, retorcida ou pervertida (como ocorre no ensino). Nesse sentido, conviver em aprendência é um ato em si realizador, não um processo preparador para alguma realização ulterior.

Escolarizar pessoas, fazê-las repetir um percurso já traçado, é como enfiá-las num tubo para retirá-las mais adiante. Enquanto elas estão dentro do tubo, não são sujeitos legítimos pelo que fazem, só serão legitimadas quando saírem. Por isso as pessoas, intimamente, não gostam de ser assim “entubadas”. Porque, no tubo, tudo que vale é o que vem depois, quando fazem qualquer coisa é sempre uma simulação preparativa para o que acontecerá depois. O tubo (unidimensional) aliena a pessoa da fluição (que sempre é multidimensional), serve de abrigo para os ventos que sopram de través, ou seja, protege-a da… aprendizagem! Com isso, frustra-lhe a realização, diminuindo-a de mundo cada vez mais um pouco.

EM QUINTO LUGAR devo dizer que sistemas que não são capazes de aprender não são sistemas de aprendizagem. Mas o que significa dizer que um sistema (educacional) é capaz de aprender?

Começando pelo avesso: uma escola, por exemplo, não é capaz de aprender. Continua basicamente a mesma desde o início desta Era Comum. Aliás, desde muito antes: já em meados do século passado o erudito Samuel Noah Kramer (1956) encontrou evidências vestigiais de escolas na antiga Suméria (há quase 6 mil anos). Brinca-se que se descongelássemos hoje uma pessoa hibernada no século 14, tudo para ela seria novidade: do relógio de pulso ao avião, passando pela TV e pela Internet, menos a escola (ah!, isso ela saberia reconhecer perfeitamente). Se a universidade, surgida como uma corporação meritocrática nos anos 1000, continua sendo, nos anos 2000, basicamente a mesma coisa (uma corporação meritocrática), então é sinal de que ela não tem grande capacidade de mudar.

Aprender é sempre a manifestação de uma capacidade de mudar de acordo com a mudança das circunstâncias. Existem fortes evidências de que só consegue fazer isso o que tem o padrão de rede (mais distribuída do que centralizada). Do cérebro à uma colônia de insetos, somente sistemas distribuídos (com múltiplos caminhos), altamente tramados por dentro e conectados para fora (quer dizer, não separados do meio por fronteiras opacas e sim por membranas permeáveis aos fluxos) podem aprender.

Nas últimas duas décadas recolhemos fartas evidências de que tudo que aprende se modifica continuamente, se constrói permanentemente, se adapta tempestivamente, se organiza autonomamente e… interage livremente. E de que a aprendizagem é sempre uma criação.

EM SEXTO LUGAR, quero reconhecer e proclamar que existe uma aprendizagem criativa que não se confunde com a aprendizagem reprodutiva (em geral confundida com ensinagem). Uma aprendizagem criativa não pode colocar toda sua ênfase na acumulação de conteúdos conhecidos, mas tem que ensejar que as pessoas possam ser livres para se aventurarem na compreensão do desconhecido. Numa época em que se fala tanto de inovação, parece que a chamada educação (sobretudo quando confunde ensino com aprendizagem) permanece intocada pelo espírito criativo. Além disso, as teorias da aprendizagem são baseadas em teorias do conhecimento que enfatizam quase que somente a aquisição de conteúdo pretérito e não a capacidade de descobrir coisas novas. Se você leu Jiddu Krishnamurti (1964) deve estar entendendo o que estou tentando dizer. Ele percebeu claramente que “o homem que está carregado de conhecimentos, de instrução, que está curvado sob o peso das coisas que aprendeu, nunca é livre. Poderá ser um homem altamente erudito, mas sua acumulação de conhecimentos o impede de ser livre, e, por conseguinte ele é incapaz de aprender” (7).

Inovação em educação é uma preparação para a descoberta. Isso praticamente não existe em nossos sistemas educacionais. E isso não se consegue ensinando às pessoas o que é inovação: inovador é quem inova, não quem fala sobre inovação. Ademais, ideias não mudam comportamentos, só comportamentos mudam comportamentos. É necessário, pois, configurar novos ambientes de livre-aprendizagem onde as pessoas possam desenvolver novos comportamentos educativos.

EM SÉTIMO LUGAR penso que é preciso reconhecer que todas as teorias da aprendizagem – digam o que quiserem dizer seus formuladores ou seguidores – são, em boa medida, cognitivistas (lato sensu). Há sempre uma resposta cognitivista, às vezes implícita, para a pergunta fundamental: Como uma pessoa aprende? A esta pergunta seguem-se outras: Que fatores influenciam a aprendizagem? Qual o papel da memória? Como ocorre a transferência (de “conteúdos”)? As respostas que damos para essas questões definem nossa visão da aprendizagem.

Mas em geral queremos saber como promover ou induzir o processo de aprendizagem de pessoas que achamos que devem aprender alguma coisa que queremos que elas aprendam. Ou seja, procuramos, na verdade, uma resposta para o ensino, não para a aprendizagem. A maior parte dos sistemas educacionais baseia-se em uma visão cognitivista, que os leva a tentar promover capacidades de raciocínio, de evocar e interpretar experiências, de computar – codificar, armazenar, recuperar, derivar para reconstruir ou construir conteúdos (que chamam de conhecimento) – e de resolver problemas. Todos esses sistemas educativos, em grande parte, ainda guardam fortes traços behavioristas: capacidade de responder positivamente a estímulos e recompensas à reprodução fiel de conteúdos pré-determinados e ao bom desempenho em processos pré-desenhados. Alguns até tentam incorporar componentes de uma visão construtivista de aprendizagem: capacidade de ressignificar, remixar, atualizar e socializar conteúdos e processos educacionais. Raramente eles contemplam visões conectivistas de aprendizagem: capacidade de estabelecer conexões e reconhecer e interpretar padrões e de abrir novos caminhos de apreensão e compartilhamento de conhecimentos e atitudes cognitivas. E praticamente nenhum deles se baseia em visões interativistas. Mas o problema é que já vivemos em sociedades de alta interatividade (a chamada sociedade-em-rede). E que sem entender o que está mudando, na transição em que estamos imersos para uma sociedade-em-rede, não será possível conceber uma nova visão da educação para o tempo presente (uma visão interativista).

Para uma visão interativista da aprendizagem tudo começa com a pergunta: O que acontece (em termos da fenomenologia da interação) quando a aprendizagem acontece? Em seguida vem outra pergunta: Com quem (ou onde) acontece o que acontece?; ou: Quem é o sujeito do processo de aprendizagem?; ou, ainda: Quem aprende?

Quase ninguém formula a última pergunta – Quem aprende? – porque a todos parece óbvio que existe um sujeito que aprende: o indivíduo. Mas o indivíduo é um conceito funcional para sociedades patriarcais; ou seja, para sociedades que mataram a rede (sim, este é o objetivo da guerra – quer dizer, da construção instrumental de inimigos para organizar cosmos sociais hierárquicos e autocráticos – que define o patriarcado: matar a rede distribuída, não eliminar indivíduos). Indivíduo é, no máximo, uma abstração estatística útil em cálculos econômicos. Seres humanos são pessoas, entroncamentos de fluxos interativos da convivência social; ou seja, já são redes sociais. Portanto, de um ponto de vista social, o aprender (humano) acontece sempre em uma rede: em uma pessoa (que só existe como tal em um emaranhado de relacionamentos).

Uma nova visão interativista da aprendizagem poderia começar a se estruturar a partir de uma combinação de visões conectivistas com a visão basilar de Humberto Maturana (1982): “Há aprendizagem quando a conduta de um organismo varia durante sua ontogenia (história) de maneira congruente com as variações do meio e o faz seguindo um curso contingente a suas interações nele”.

Mas isso pode ser só o início. Começando por estabelecer conexões e reconhecer padrões, passando pelo linguajear e o conversar como atividades tipicamente humanas, uma visão interativista da aprendizagem deve se desdobrar nas funções sociais associadas ao que chamamos de inteligência coletiva.

E aí ressurgem aquelas perguntas (que em geral não são feitas). Quem aprende: o indivíduo ou a pessoa (o emaranhado)? Se assim como o processo que chamamos de vida, o processo de interação que chamamos de convivência social também implica acoplamento estrutural (proporcionando sempre alguma aprendizagem aos sujeitos envolvidos), o que devemos fazer (ou, sobretudo, o que devemos não-fazer) para não impedir ou dificultar essa aprendizagem que ocorrerá de qualquer modo (desde que haja interação)?

Para um ponto de vista interativista, toda aprendizagem é criação (que é sempre cocriação) ou invenção (você só aprende verdadeiramente o que inventa) e, portanto, envolve uma dinâmica, em certo sentido, oposta àquela do ensino (que é sempre reprodução). Assim, a livre-aprendizagem (interativa) é desensino e, não havendo separação entre a produção (ou descoberta) de conhecimento e a sua recepção (ou assimilação), não há mais separação entre aprendizagem e pesquisa quando essas ações são compartilhadas. A aprendizagem é então fruto da busca e da polinização.

A hipótese do acoplamento estrutural de Maturana-Varela é uma espécie de background para a formulação de respostas para essas perguntas que, em geral, não são feitas pelos teóricos da educação, mas ela mesmo não pode ser a resposta. Faltam-lhe os conceitos da fenomenologia da interação: por exemplo, toda aprendizagem envolve cloning; ou: todo sujeito da livre-aprendizagem se conforma por clustering; ou ainda: swarmings contraem as linhas temporais acelerando a aprendizagem, permitindo a emergência do aprendedor ou aprendente colaborativo e de uma outra ordem de inteligência: que, na falta de um termo melhor, chamamos de inteligência coletiva; por último: o crunching contrai as distâncias que “somavam a gente para menos” para citar o poeta – Manoel de Barros (1986) – e potencializam a aprendizagem de um modo que ainda desconhecemos. Estamos tratando aqui, obviamente, de uma nova teoria da aprendizagem, não mais baseada em uma teoria do conhecimento e sim em uma teoria da alostase social.

EM OITAVO LUGAR, quero dizer que existe uma aprendizagem tipicamente humana conforme a uma inteligência tipicamente humana (sintonizada com o emocionar humano). O que poderia caracterizar uma inteligência tipicamente humana? Não é, por certo, o fato de ela ser considerada superior a de outros animais ou de outros seres vivos (o que ela não é realmente se olharmos as longas linhagens filogenéticas de seres que produzem a chamada inteligência coletiva na sua interação, como os cupins construindo um cupinzeiro ou como as bactérias que colonizam nossos corpos como planetas). Uma inteligência tipicamente humana não é a inteligência prodigiosa das máquinas que ainda serão inventadas, dos futuros seres cibernéticos. Ademais – e aqui parece estar uma novidade – a inteligência tipicamente humana não é também a inteligência extraordinária de indivíduos extremamente bem dotados de capacidades cognitivas, de prodigiosa memória e de formidável raciocínio lógico. Não. A inteligência tipicamente humana é aquela inteligência empática, que no simples ato de se manifestar ou se exercer, já se acopla estruturalmente à inteligência de outros humanos. É como se fosse o espelhamento, no que cada pessoa tem de único, da inteligência dos emaranhados sociais em que existimos como seres humanos. Não é uma inteligência individual que se combina com outras inteligências individuais. É a inteligência que só emerge em cada um de nós, humanos, porque no próprio processo de sua gênese já incorpora a interação sinérgica, simpática e simbiótica, com outros humanos (que lembra a temática da recente série televisiva das Wachowskis, Sense8). E, portanto, é uma inteligência colaborativa (e isso implica que a inteligência competitiva – tão buscada por organizações hierárquicas, no afã de derrotarem seus concorrentes, vencerem seus adversários ou destruírem seus inimigos – não é uma inteligência tipicamente humana). Essa afirmação é surpreendente também porque desconstitui as teorias cognitivistas da aprendizagem voltadas a maximizar a inteligência. Ela significa que não é a quantidade de inteligência (passível de ser medida pelos indicadores de inteligência comumente usados nos testes de inteligência) que caracteriza a inteligência tipicamente humana e, ao mesmo tempo, que nossa inteligência não é superior a de outros seres vivos (inclusive de outros animais humanos) e, ainda, que podemos ter inteligências extraordinárias de indivíduos humanos que não são tipicamente humanas. A inteligência tipicamente humana é uma espécie de sacramento, uma sombra do que ainda virá (e que será o que será, quando for e toda vez que vir). É uma inteligência humanizante. É a inteligência de um simbionte social se prefigurando.

NOTAS E REFERÊNCIAS

(1) “No nível do estrato arqueológico conhecido como Uruk A, que está imediatamente acima do de Obeid e pode ser grosseiramente datado por vota de 3.500 a. C., as áreas de templos do sul da Mesopotâmia podem ser vistas notavelmente aumentadas em tamanho e importância; e, então, de súbito [atenção para este aposto, porque ele é o mais importante, repetindo:], de súbito, em uma data crucial que pode ser fixada quase com precisão em 3.200 a. C. (no período do estrato arqueológico conhecido como Uruk B), surge naquela pequena região lodosa suméria – como se as flores de suas minúsculas cidades subitamente vicejassem – toda a confluência cultural que a partir de então constituiu a unidade germinal de todas as civilizações avançadas do mundo. E não podemos atribuir esse evento a qualquer conquista da mentalidade de simples camponeses. Tampouco foi a consequência mecânica de um mero acúmulo de artefatos materiais, economicamente determinados. Foi a criação factual e claramente consciente (isto pode ser afirmado com total certeza) da mente e ciência de uma nova ordem de humanidade que jamais havia surgido na história da espécie humana: o profissional em tempo integral, iniciado e estritamente arregimentado, sacerdote de templo”. Campbell, Joseph (1959) em As Máscaras de Deus.

(2) “Penso que é de fundamental importância reconhecer conscientemente que a educação é uma forma de iniciação. Até mesmo no sistema vigente, temos um período de treinamento, e depois passamos por um tempo de provas ou de provação. Alguns fracassam, outros passam, e o que passam tornam-se iniciados. Temos exames em todos os níveis, e cada nível de iniciação é acompanhado de impressionantes cerimônias públicas de formatura. Nesse domínio, continua a preponderar a hierarquia medieval completa, com togas, títulos de bacharel, de mestre, de doutor em filosofia, e assim por diante. Os iniciados assemelham-se a um sacerdócio secular qualificado para dirigir e ordenar a sociedade. Das suas fileiras são recrutados nossos burocratas, cientistas, tecnocratas e intelectuais”. Rupert Sheldrake (1992) em Triálogos nas Fronteiras do Ocidente.

(3) “Quando tento ensinar, como faço às vezes, fico consternado pelos resultados, que me parecem praticamente inconsequentes, porque, por vezes, o ensino parece ser bem-sucedido. Quando isso acontece, verifico que os resultados são prejudiciais, parecem levar o indivíduo a desconfiar da sua própria experiência e isso destrói uma aquisição de conhecimentos que seja significativa. Por isso, sinto que os resultados do ensino ou não têm importância ou são perniciosos… Posso... [dizer que], se a experiência dos outros for semelhante à minha e se eles tiverem chegado a idênticas conclusões, decorrerão deste fato inúmeras consequências: a) Uma tal experiência implicaria que se deveria renunciar ao ensino. As pessoas teriam de reunir-se se quisessem aprender; b) Devíamos renunciar aos exames. Eles medem apenas o tipo de ensino inconsequente; c) Pela mesma razão, deveríamos acabar com diplomas e graus acadêmicos; d) Deveríamos abandonar os diplomas como títulos de competência, em parte pela mesma razão. Outra razão reside no fato de um diploma marcar o fim ou a conclusão de alguma coisa, e aquele que aprende está unicamente interessado em continuar a aprender”. Carl Rogers (1952) em Reflexões pessoais sobre ensinar e aprender.

(4) “Crianças não são apenas extremamente boas em aprender; elas são muito melhores nisso do que nós, adultos. Como professor, levei muito tempo para descobrir isso. Eu era um professor engenhoso e cheio de recursos, hábil no planejamento de aulas, demonstrações, formas de motivação e toda a parafernália pedagógica possível. E foi somente aos poucos, e dolorosamente – acreditem em mim: dolorosamente -, que aprendi o seguinte: quando passei a ensinar menos, as crianças começaram a aprender mais. Posso resumir em cinco ou sete palavras o que casualmente aprendi como professor. A versão de sete palavras é esta: “Aprender não é o produto de ensinar”. A versão de cinco palavras é esta: “Ensinar não produz a aprendizagem”. Como mencionei antes, a educação formal opera com o pressuposto de que as crianças aprendem somente o que, quando e porque lhes ensinamos. Isso não é verdade. Está, de fato, muito perto de ser 100% falso”. John Holt (1989) em Aprendendo o tempo todo.

(5) “Para Don Juan, o mundo da vida diária não é real, como acreditamos que seja: “a realidade ou o mundo que todos conhecemos é apenas uma descrição”. A fim de revalidar essa premissa, Don Juan concentrou seus melhores esforços no sentido de me conduzir a uma convicção sincera de que o que eu pensava como sendo o mundo próximo era apenas a descrição do mundo, a qual me tinha sido inculcada desde o momento em que nasci. Ele mostrou que todos que entram em contato com uma criança são um mestre que lhe descreve o mundo sem cessar, até o momento em que a criança é capaz de perceber o mundo conforme descrito. Segundo Dom Juan, não temos recordação daquele momento portentoso, simplesmente porque nenhum de nós poderia ter qualquer ponto de referência para compará-lo com qualquer outra coisa. A partir daquele momento, porém, a criança é sócia. Ela sabe a descrição do mundo; e sua qualidade de sócia torna-se completa, imagino, quando ela é capaz de fazer todas as interpretações perceptíveis adequadas que, conformando-se com aquela descrição, a revalidem. Para Don Juan, portanto, a realidade de nossa vida diária consiste num fluxo interminável de interpretações perceptíveis que nós, os indivíduos que partilhamos de uma sociedade específica, aprendemos a fazer em comum. A ideia de que as interpretações perceptíveis que constituem o mundo têm um fluxo é congruente com o fato de correrem ininterruptamente e serem raramente, se alguma vez o são, suscetíveis de indagação. De fato, a realidade do mundo que conhecemos é aceita tão normalmente que a premissa básica de que a nossa realidade é apenas uma das muitas descrições, mal poderia ser considerada uma tese séria”. Carlos Castaneda em  Viagem a Ixtlan, livro que nasceu da tese de PhD de Castaneda na UCLA, em 1973, com o título: “Sorcery: A Description of the World”.

(6) “Em nossa cultura patriarcal, o emocionar fundamental em relação à noção de progresso é próprio dos desejos de apropriação ou autoridade, implícitos nas conversações de hierarquia, crescimento, controle e subordinação. Todavia, o controle dos outros, a obediência sob as relações hierárquicas que se mantêm pela coerção e o crescimento como uma acumulação de bem-estar pela apropriação dos meios de vida dos outros, são ações que mantêm a exclusão e geram miséria material, depredação ambiental e sofrimento. Isso acontece porque tais circunstâncias são dinâmicas de negação recorrente dos fundamentos matrísticos de nossa infância ocidental e, mais profundamente, de nossa constituição como seres humanos. São, pois, intrinsecamente negadoras do respeito mútuo e do autorrespeito constitutivos do viver democrático. Além do mais, essa maneira de viver, no contínuo jogo da competição e da demanda de estabilidade, faz da educação um instrumento de criação de meninos e meninas patriarcais. Eles viverão em contradição emocional, pois o farão tanto na contínua negação da democracia como modo de coexistência humana, quanto na permanente nostalgia da recuperação de seus fundamentos matrísticos”. Humberto Maturana (1993) em Conversações matrísticas e patriarcais.

(7) “Em geral, aprendemos pelo estudo, por meio de livros, pela experiência, ou mediante instrução ministrada por outro. São essas as maneiras comuns de aprender. Aprendemos de memória o que devemos fazer e o que não devemos fazer, o que devemos pensar e o que não devemos pensar, como devemos sentir, como devemos reagir. Pela experiência, pelo estudo, pela análise, pelo sondar, pelo exame introspectivo, armazenamos conhecimentos na forma de memória e, depois, a memória “responde” a ulteriores “desafios” e exigências, do que resultam conhecimentos e mais conhecimentos. Tal processo nos é bastante familiar, pois é nossa única maneira de aprender. Se não sei pilotar um avião, aprendo a fazê-lo. Recebo a necessária instrução, vou adquirindo experiência, que fica retida na memória, e, por fim, posso voar. É esse o único processo de aprender familiar à maioria de nós. Aprendemos pelo estudo, pela experiência, pela instrução. O que se aprende é confiado à memória, na forma de conhecimento, e esse conhecimento funciona sempre que se apresenta um “desafio” ou todas as vezes que temos de fazer alguma coisa. Ora, eu penso que há uma maneira de aprender completamente diferente, e sobre esse assunto vou dizer algumas palavras; mas, para poderdes compreender essa maneira e por ela aprender, deveis estar totalmente livres da autoridade, porque, do contrário, estareis apenas sendo instruídos e ireis apenas repetir o que ouvistes dizer. Eis porque tanto importa compreender a natureza da autoridade. A autoridade é um empecilho ao aprender – ao aprender que não é acumulação de conhecimentos na forma de memória. A memória reage sempre por padrões; nenhuma liberdade existe. O homem que está carregado de conhecimentos, de instrução, que está curvado sob o peso das coisas que aprendeu, nunca é livre. Poderá ser um homem altamente erudito, mas sua acumulação de conhecimentos o impede de ser livre, e, por conseguinte ele é incapaz de aprender”. Jiddu Krishnamurti (1964) em A mente sem medo.

AUTORES CITADOS NA APRESENTAÇÃO

BARROS, Manoel (1986). Livro sobre Nada in Poesia Completa. São Paulo: Leya, 2010.
CAMPBELL, Joseph (1959). As máscaras de Deus – Mitologia primitiva. São Paulo: Palas Athena, 1992. CASTANEDA, Carlos (1972). Viagem à Ixtlan. Rio de Janeiro: Record, 1972.
CONDORCET, Marquês de (1792). Relatório de projeto de decreto sobre a organização geral da instrução pública in Hippeau: A Instrução Pública na França durante a Revolução. Disponível no link: http://goo.gl/RVpyEO
FOUCAULT, Michel (1975). Os recursos para o bom adestramento in Vigiar e punir. Petrópolis: Vozes, 1999.
HOLT, John (1989). Aprendendo o tempo todo. Campinas: Versus, 2006.
ILLICH, Ivan (1970). Sociedade sem escolas. Petrópolis: Vozes, 1985.
KRAMER, Samuel Noah (1956). A história começa na Suméria. Lisboa: Europa-América, 1997.
KRISHNAMURTI, Jiddu (1964). A mente sem medo. São Paulo: Cultrix, s/d.
MATURANA, Humberto (1982). Aprendizaje o deriva ontogénica. Disponível no link: http://goo.gl/ehFPcz
MATURANA, Humberto (1993). Conversações matrísticas e patriarcais in Amar e Brincar: fundamentos esquecidos do humano (com Gerda Verden-Zoeller). São Paulo: Palas Athena, 2009.
NIETZSCHE, Friedrich (1888). Os “melhoradores” da humanidade, Parte 2 e O que falta aos alemães, Parte 5 in O crepúsculo dos ídolos, ou Como filosofar com o martelo. Disponível no link: http://goo.gl/RXudb3
ROGERS, Carl (1952). Reflexões pessoais sobre ensinar e aprender in Tornar-se pessoa (1961), Capítulo XI. São Paulo: Martins Fontes, 1976.
ROGERS, Carl (1980). Para além do divisor de águas: onde agora? in Um jeito de ser. São Paulo: EPU, 1987.
SHELDRAKE, Rupert (1992). Triálogos nas fronteiras do Ocidente (com Ralph Abraham e Terence McKenna). São Paulo: Cultrix, 1994.
TOLSTOI, Leon (1862). Da Instrução Popular in Obras Pedagógicas. Moscou: Edições Progresso, 1988.

UMA VISÃO INTERATIVISTA DA APRENDIZAGEM

Eis, no seu estado atual, os contornos de uma visão interativista da aprendizagem.

As considerações seguintes são apenas apontamentos para a formulação de uma teoria interativista da aprendizagem humana, que ainda não foi completamente construída em razão da incipiência de nossos conhecimentos atuais sobre a fenomenologia da interação social. Ou seja, sustenta-se aqui que ainda não temos condições de formular uma teoria da aprendizagem (tipicamente) humana e por que tal teoria seria necessariamente uma teoria interativista social. O que se lerá nesta parte, portanto, deve ser tomado mais como um exercício heurístico do que teorético.

Por incrível que possa parecer, a reflexão mais avançada sobre o tema ainda é a de Maturana, que começou em 1971, juntamente com seu aluno e depois parceiro Francisco Varela, com o desenvolvimento do conceito de autopoiese e praticamente terminou na década de 80 do século passado, com o artigo seminal Aprendizagem ou deriva ontogênica (1982) e com outros textos menos importantes, como a primeira parte do livro Emoções e linguagem na educação e na política (1988). A hipótese central dessas reflexões sobre uma concepção interativista da aprendizagem é a do acoplamento estrutural (1).

É certo que George Siemens e Stephen Downes, começaram, a partir do início do presente século, a tentar formular uma concepção conectivista da aprendizagem mais condizente com o que chamam de “era digital” (que, desgraçadamente, tomam pela sociedade-em-rede). Esse tem sido um esforço importante que, entretanto, não pode ajudar muito no desenvolvimento de uma teoria interativista da aprendizagem e de uma teoria da aprendizagem humana (que é social e não digital) (2).

É necessário, pois, partir da ideia fundamental de acoplamento estrutural, até agora a única vertente explicativa não-cognitivista seriamente formulada para a aprendizagem.

ACOPLAMENTO ESTRUTURAL

A aprendizagem não tem propósito

Maturana afirma que “há aprendizagem quando a conduta de um organismo varia durante sua ontogenia (história) de maneira congruente com as variações do meio e o faz seguindo um curso contingente a suas interações nele“. Ele admite que, “embora o fenômeno designado pelo termo aprendizagem possa ser descrito de muitas maneiras diferentes, como quando se fala da “geração de uma conduta adequada ao meio a partir de uma experiência prévia”, ou ainda da “aquisição de uma nova habilidade como resultado da prática”, de acordo com o que o observador queira enfatizar, parece-me que a caracterização que proponho acima é necessária e suficiente para abranger todos os casos possíveis” (3).

A partir daí, Maturana vai distinguir “duas perspectivas básicas para lidar com o fenômeno da aprendizagem, se quisermos explicá-lo:

Segundo uma perspectiva, o observador vê que o meio está lá, do lado de fora, como o mundo em que o organismo tem que existir e atuar, e que lhe proporciona a informação, os dados, os significados de que necessita para fazer uma representação do mesmo, e assim calcular o comportamento adequado que lhe permitirá sobreviver nele. De acordo com esta visão a aprendizagem é o processo pelo qual o organismo obtém informação do meio e constrói dele uma representação que armazena em sua memória e utiliza para gerar seu comportamento em resposta às perturbações que dele provêm. A partir deste ponto de vista, a recordação consiste em encontrar na memória a representação requerida para calcular as respostas adequadas às interações recorrentes do meio.

Nesta perspectiva o meio é instrutivo, pois especifica no organismo mudanças de estado que, por serem congruentes com ele, constituirão uma representação.

Segundo a outra perspectiva, o observador vê que o comportamento de um organismo (incluindo seu sistema nervoso) está determinado a cada instante por sua estrutura, e que só pode ser adequado ao meio se esta estrutura é congruente com a estrutura do meio e sua dinâmica de mudanças. De acordo com esta visão a aprendizagem é o próprio curso da mudança estrutural que segue o organismo (incluindo seu sistema nervoso) em congruência com as mudanças estruturais do meio, como resultado da recíproca seleção estrutural que se produz entre aquele e este durante a recorrência de suas interações, com conservação de suas respectivas identidades. Segundo esta visão o organismo não constrói uma representação do meio e nem calcula um comportamento adequado a ele. Desta perspectiva, para o organismo, em seu operar, não há meio, não há recordação nem memória, mas somente uma dança estrutural no presente que segue um curso congruente com a dança estrutural do meio, ou se desintegra.

Nesta perspectiva o comportamento do organismo permanece adequado apenas se este conserva sua adaptação durante suas interações, e o que um observador vê como recordação consiste precisamente nisso, na aparição de comportamentos que ele vê como adequados porque o organismo conserva sua adaptação frente a perturbações do meio que ele vê como recorrentes. Segundo esta visão não há interações instrutivas. O meio apenas seleciona as mudanças estruturais do organismo, e não as especifica” (4).

E ele então escolhe a perspectiva que vai adotar:

Na medida em que o organismo (incluindo o sistema nervoso) é um sistema determinado estruturalmente, a perspectiva informacionista, que requer interações instrutivas porque exige que o meio especifique no organismo (e seu sistema nervoso) as mudanças que lhe permitem criar uma representação dele, deve ser abandonada. Em outras palavras, considero que a perspectiva informacionista é constitutivamente inadequada se o que se quer é tratar dos seres vivos como sistemas determinados estruturalmente. A outra perspectiva, no entanto, não requer interações instrutivas e é compatível com um tratamento do organismo e do sistema nervoso como sistemas determinados estruturalmente. Esta, portanto, será a perspectiva que vou adotar” (5).

E reafirma para esclarecer:

Correntemente se pensa que o aprender envolve uma certa intencionalidade, um certo propósito. Isso porque, em geral, se pensa que o que é central em todo comportamento são suas consequências. Isto é um erro. O propósito que vemos nos comportamentos não pertence a eles, mas à descrição ou ao comentário do observador. Tal descrição é boa na conversação, mas é enganadora no domínio conceitual. A aprendizagem não tem propósito, é uma consequência da mudança estrutural dos seres vivos sob condições de sobrevivência com conservação da organização e da estrutura. Não há representação do meio, não há ação sobre o meio, não há memória, não há passado nem futuro, somente o presente. Porém, porque há aprendizagem há linguagem e descrições nas quais o passado e o futuro surgem… e podemos equivocar-nos sobre a aprendizagem” (6).

Apenas a transcrição acima é suficiente para mostrar – como já foi afirmado – que ninguém se aproximou tanto de uma visão interativista, pode-se dizer, não informacionista (ou, nos nossos termos, não cognitivista) do que Maturana.

O objetivo das considerações seguintes é mostrar que a visão de Maturana é fundamental para uma teoria interativista da aprendizagem dos seres vivos, mas ela não pode dar respostas para a aprendizagem tipicamente humana. Mesmo com o conceito ampliado de biologia de Maturana, não se pode derivar da biologia, ou melhor, do modo como a biologia explica como os seres vivos aprendem, todo o arcabouço explicativo para a aprendizagem humana (e deve-se dizer que nem Humberto Maturana e nem seu aluno e depois parceiro Francisco Varela pretenderam isso). A investigação sobre como o sistema nervoso aprende (ou sobre os fenômenos que são observáveis ou inferíveis no sistema nervoso durante o processo que chamamos de aprendizagem) pode, por certo, lançar muita luz sobre o fenômeno da aprendizagem dos seres vivos em geral, mas não é suficiente para explicar a aprendizagem tipicamente humana, que é social, não biológica.

Por certo Maturana não queria derivar o social do biológico e nem mesmo captar fenômenos mais gerais que explicassem tanto o comportamento dos seres vivos (organismos, partes de organismos e ecossistemas) quanto de seres sociais (pessoas ou redes de pessoas). A seu favor podemos dizer que seus procedimentos não podem ser acusados de deslizamento epistemológico. Mas mesmo que não o sejam, também não podem revelar características comuns ao que é vivo e ao que é social, a menos que: a) se baseassem numa investigação da fenomenologia da interação em seres vivos e em seres sociais (quer dizer, em pessoas ou redes humanas); b) levassem em conta uma outra ordem de fenômenos que só acontecem em redes sociais. Mas nenhum desses dois requisitos foi atendido.

A autopoiese, o conceito central de Maturana e Varela (1971), não pode ser útil, a não ser como inspiração para a formulação de uma teoria da aprendizagem humana. Varela (1992) afirmou que “uma extensão da autopoiese em níveis “superiores” não é frutífera e deve ser deixada de lado“, mas um ano antes havia chegado a admitir que seria claramente frutífero “vincular a autopoiese com uma opção epistemológica, além da vida celular ao operar do sistema nervoso e os fundamentos da comunicação humana” (7). Parece que sim no que tange a organismos multicelulares, mas não à comunicação humana (um fenômeno – ou melhor, o fundamento do – social).

A autopoiese caracteriza a vida, mas não completamente a sociedade a não ser num sentido metafórico ou metonímico (8). A rigor o conceito original (que Maturana chama de autopoiese de primeira ordem) não pode ser aplicado nem mesmo a um organismo multicelular (como um animal). Quanto mais à uma sociedade. A sociedade não é uma coleção de seres vivos (no caso, dos seres vivos do domínio eukaryota, do reino animalia, do phylum chordata e vertebrata, da classe mammalia e eutheria, da ordem dos primatas e haplorrhini, da família hominidae e homininae, do gênero homo e da espécie homo sapiens). O que vale para cada indivíduo da espécie homo sapiens não vale necessariamente para o que ocorre entre os homo sapiens (quando eles se tornam pessoas). Os homo sapiens só se tornam pessoas quando acontece algo entre eles. Neste caso, talvez precisássemos de um novo conceito como o de alterpoiese e não apenas de autopoiese.

ALTERPOIESE

A sociedade é uma outra criação

A alterpoiese aqui aventada não é um conceito substitutivo, complementar ou suplementar ao de autopoiese. Pode ser tomado (embora, talvez, não venha a se tornar apenas isto, dependendo do curso das atuais investigações) como uma metáfora para dizer, no caso, que a sociedade é uma outra criação. E é uma criação peculiar porque não está determinada pela sua origem (e não é totalmente dependente da sua trajetória) (9).

Ainda que a interação social siga regularidades (ou leis) que podem ser observadas em qualquer interação (notadamente na interação de seres self-propelled), há uma margem de aleatoriedade (ou de não-determinação) incomparavelmente maior (ou, talvez dizendo melhor, de outra natureza) na interação social (quer dizer, de humanos propriamente ditos ou pessoas) do que na interação que ocorre em organismos e partes de organismos biológicos e ecossistemas naturais.

Não é que não haja organismos sociais (num sentido ampliado do termo organismo). Mas que os organismos sociais são de outra natureza (e é neste sentido que se pode afirmar que o social é uma outra criação). Seres humanos propriamente ditos, quer dizer, pessoas, são gerados na entreidade e não determinados por sua organização ou por sua estrutura (interna) como indivíduos. Do contrário não haveria lugar para a liberdade. Ora, parodiando Tolstoi, a liberdade é o único fundamento da aprendizagem tipicamente humana.

Mas a liberdade depende do modo como os seres humanos interagem. Por exemplo, se eles se isolam e não se associam não pode haver liberdade. Se eles não se associam para contender com um problema ou para realizar um projeto comum nascido dos seus desejos semelhantes ou congruentes, não pode haver liberdade. E se eles não criam novas realidades sociais a partir de tudo isso, não pode haver liberdade. Quando fazem tudo isso, porém, os seres humanos não o fazem porque é necessário e sim, frequentemente, porque é desnecessário. O social é um campo que se cria a si mesmo a partir da interação fortuita, a rigor desnecessária. Toda aprendizagem tipicamente humana é social, não biológica. E é desnecessária porque é uma invenção: uma criação coletiva, o advento de algo que não estava no horizonte concebido de eventos. Isto é alterpoiese: a criação-entre, a criação de novas entreidades, vale dizer, de novas realidades sociais.

O interativismo como teoria da aprendizagem humana tem por base uma visão social da aprendizagem. Segundo essa visão, não é suficiente – para entender a aprendizagem tipicamente humana – tentar explicar como um indivíduo da espécie homo sapiens aprende descrevendo os fenômenos que acontecem no seu sistema nervoso (ou no seu sistema imunológico, uma investigação que, aliás, Varela tentou levar mais adiante). É preciso explicar como pessoas aprendem descrevendo os fenômenos que ocorrem nos emaranhados (sociais) onde as pessoas estão – e são! Por isso, enquanto não investigarmos com profundidade a fenomenologia da interação social não poderemos construir uma teoria da aprendizagem humana. Os fenômenos que ocorrem na interação entre pessoas não são completamente inferíveis dos fenômenos que ocorrem no nível molecular ou celular ou de partes do organismo de um ser vivo, como um animal (mesmo que este animal seja o homo sapiens).

Tudo isso é para dizer, em primeiro lugar, que não se pode acusar Maturana, nem Varela, de tentarem reduzir o social ao biológico. Em segundo lugar, que sua investigação biológica forneceu elementos fundamentais para a concepção de uma visão interativista. E, em terceiro lugar, que a visão interativista da aprendizagem baseada em suas investigações não pode, sozinha, dar base para a formulação de uma teoria interavista da aprendizagem humana.

Sobre esse terceiro ponto, porém, cabe fazer mais algumas considerações.

Assim como um ser humano (definido como um indivíduo da espécie homo sapiens) não é um agregado de células, um sistema social também não é um agregado de organismos. Mas há, ademais, uma diferença fundamental entre o que é vivo e o que é social. O ser propriamente humano não é (apenas) vivo, é (também) social. O ser vivo do humano, como reconheceu o próprio Maturana, não consuma o humano: é necessário mas não suficiente para o humano, pois é (apenas) humanizável. A humanização do humano-biológico (do portador do genoma humano) só acontece na interação humano-social (segundo Maturana, por meio do linguajear e do conversar). Mas não é que existam, primeiro, os humanos para, depois, quando os humanos interagirem entre si, surgir o social. É quando o social surge, que surgem os humanos propriamente ditos, quer dizer, as pessoas.

O fato de sistemas sociais serem compostos por seres humanos não significa que se possa derivar das características do ser biológico humanizável as características do ser social que chamamos de ser humano (o ser humanizado pela interação social).

Mesmo que a investigação da fenomenologia da interação avance a ponto de revelar características gerais que tanto se apliquem a seres biológicos complexos (como o animal humano) quanto a seres sociais complexos (como o humano propriamente dito ou a pessoa), mesmo assim faltará investigar o que é próprio da fenomenologia da interação social. Claro que existem leis gerais da interação que valem para ambos (seres vivos e seres sociais) e que inclusive valem para seres não vivos (de vírus à nuvens de nanopartículas e, em especial, para uma variedade de máquinas self-propelled capazes de interagir, como nanoquadrotors e. g.). A interação social, todavia, tem características que não são encontradas na interação do vivo e do não-vivo capaz de mudar de comportamento em função da interação.

A construção (social) da pessoa não pode ser reduzida a uma espécie de epigênese. Estamos tratando de uma nova entidade que é produzida por uma outra ordem de fenômenos que são próprios da interação social. A pessoa como nova entidade é um emaranhado social aberto que se constrói ao longo de uma história fenotípica e que não mantém necessariamente, para usar uma metáfora biológica, invariâncias na sequência do DNA do organismo (como no caso da epigênese).

Devemos reconhecer honestamente que nossos conhecimentos são insuficientes para saber como se dá o surgimento dessa nova entidade, mas já sabemos que a liberdade é um desses “fenômenos” que promovem a pessoa à condição de entidade sem comparação no mundo vivo (ou não-reduzível aos processos que caracterizam o que é vivo). Liberdade, entretanto, não é uma condição do indivíduo livre de toda coerção. A liberdade depende de relações comunicativas, quer dizer, da interação: como já foi dito, só se pode atingir autonomia pessoal em associação com outros. Isso significa que só se alcança a liberdade quando se atua em rede (e na medida em que essa rede for mais distribuída do que centralizada). Como atributo do modo como os seres humanos se organizam, liberdade só se define, portanto, na entreidade. Mas a liberdade é a capacidade de alterar a continuidade da trajetória passada (ou de interromper a reprodução inercial de passado abrindo caminhos inéditos para o futuro). Não é apenas uma condição de vulnerabilidade à mudança aleatória mantendo-se fiel à organização que define a identidade de uma entidade, mas a capacidade de criar, inclusive, outras identidades.

Por isso, só no mundo social pode haver liberdade. Não pode haver liberdade no mundo vivo. A liberdade é o que permite aos seres humanos serem infiéis à sua origem, ao seu genos (social), coisa que não pode acontecer no mundo vivo sob pena de desconstituição da identidade que caracteriza sua organização (quer dizer, a própria vida).

A liberdade é sempre a liberdade de desobedecer a lei, mas não apenas às normas culturais, jurídicas e políticas. É a liberdade de desobedecer a qualquer lei e não estar regido por qualquer lei (mesmo física ou biológica), criando novas realidades sociais que não podem estar mais submetidas à disposições pregressas (ou estabelecidas ex ante à interação). Então, quando se diz que os seres humanos não podem alcançar autonomia pessoal sem se associar a outros seres humanos, é necessário acrescentar que eles só alcançam de fato tal autonomia quando, na sua interação, criam novas realidades sociais. Portanto a liberdade, stricto sensu, é sempre a liberdade de criar novos mundos sociais.

Autonomia pessoal é criação-entre (esta é a definição nua e crua de alterpoiese). A liberdade é, portanto, a liberdade de criar o que não existe, vale dizer, o que não está determinado por qualquer ordem já estabelecida. O processo criativo cria novos mundos sociais (este é o sentido da liberdade, pois velhos mundos estão sob disposições já existentes que tendem a conservar padrões de organização e modos de regulação aderentes a determinados padrões de organização e vice-versa). Mas novos mundos sociais são, do ponto de vista da aprendizagem, novas pessoalidades.

UMA VISÃO SOCIAL DA APRENDIZAGEM

Assim como a vida imita a vida, a pessoa imita o social

Pessoalidade é uma dimensão social que define o humano propriamente dito. A pessoa não é o indivíduo de uma espécie. A pessoa não nasce. A pessoa não morre. A pessoa é um clone de uma configuração social. O que chamamos de pessoalização é o processo social de geração da pessoa.

Quando vida humana e convivência social se aproximam – e isso pode ser notado mais facilmente com o aumento da interatividade – revelam-se os “tanques” onde somos gerados como seres propriamente humanos. Esses “tanques” onde somos clonados como pessoas são clusters, “regiões” da rede social a que estamos mais imediatamente conectados. Deve-se entender a palavra clone no sentido da fenomenologia da interação chamada cloning. As pessoas não são clones (no sentido de cópias) de indivíduos, e sim no sentido de que assim como a vida imita a vida (o sentido original do termo klon – do grego κλώνος – usado para designar “broto” ou “rebento”) a pessoa imita o social. Trata-se de um clone de uma configuração de pessoas. “Toda pessoa – dizia Novalis (1798) – é uma pequena sociedade“; quer dizer, pessoa já é rede! Pessoal é um ente que replica uma configuração social.

Em um mundo fracamente conectado, os caminhos são individuais. Cada pessoa vive sua vida, faz suas escolhas, estabelece suas rotinas e toma suas iniciativas sob a influência das demais, é claro, mas como se fosse uma unidade separada. Convive, por certo, com as demais, mas essa convivência é vivida como distinta daquela outra vida, que seria a sua própria vida. Pode viver a ilusão de que vive sua vida, fazendo suas escolhas, estabelecendo suas rotinas e tomando suas iniciativas de modo autônomo. Pode alimentar a crença de que já surgiu no mundo como pessoa, quer em virtude de uma instância super-humana que assim a tenha criado, quer por força da genética (o “sangue”) e das experiências particulares pelas quais passou logo após seu nascimento (o “berço”).

Em mundos altamente conectados tende a se esvair essa separação entre vida humana e convivência social. Nossas escolhas racionais raramente são (só) nossas: reproduzimos padrões, imitamos comportamentos e cooperamos com outras pessoas sem ter feito individualmente e conscientemente tais escolhas. Adotamos princípios, escolhemos carreiras, compramos produtos e priorizamos atividades em função do que fazem as pessoas que se relacionam conosco ou que estão ligadas a nós em algum grau próximo de separação, muitas vezes pessoas que nem conhecemos (como os amigos dos amigos de nossos amigos).

Vivemos então, cada vez mais, a vida do nosso mundo constituído pela convivência e não apenas a nossa vida individual. Isso ocorre na razão direta da interatividade do mundo em que estamos imersos. O fluxo da nossa timeline (no espaço-tempo dos fluxos) pode chegar a atingir tal intensidade ou densidade que, no limite, não podemos mais afirmar inequivocamente que há um eu que deseja, julga, raciocina, escolhe e almeja de forma autônoma em relação à nuvem de conexões que nos envolve. Ao mesmo tempo, sentimos e sabemos que continuamos sendo uma pessoa, única, totalmente diferenciada. Mas ao viver a nossa vida (a vida humana única dessa pessoa que somos), vivemos, na verdade, a convivência (social, também única, desse mundo construído pelo emaranhado de conexões onde estamos fluindo e que nos constitui como seres propriamente humanos).

O social passa a ser o modo de ser humano nas redes com alta tramatura dos novos mundos de interatividade elevada. Em outras palavras, passamos a constituir um organismo humano “maior” do que nós. Passamos a compartilhar muitas vidas, com tudo o que isso compreende: memórias, sonhos, reflexões de multidões de pessoas, que ficam distribuídas por todo esse superorganismo humano (e é desse ponto de vista que faz sentido a hipótese de que existe algo como um simbionte social se prefigurando). Podemos ter acesso imediato a um conjunto enorme de informações e, muito mais do que isso, podemos gerar conhecimentos novos com uma velocidade espantosa e com uma inteligência tipicamente humana (não de máquinas, computadores ou alienígenas), porém assustadoramente diferente daquela que experimentamos quando não vivemos a nossa convivência.

Os “tanques” onde somos gerados como seres propriamente humanos são os clusters onde convivemos com outras pessoas (seres que já foram humanizados pelo mesmo processo) a partir do nascimento. De sorte que não somos humanos apenas por força da genética, da reprodução ou da hereditariedade biológica (que replicamos como indivíduos da espécie homo sapiens) e sim em virtude da rede social em que com-vivemos, cuja configuração particular replicamos como pessoas. Aquele que é geneticamente humanizável só consuma tal condição a partir do relacionamento com seres humanizados. Somos (enquanto seres sociais) filhos da rede social. E não podemos ser humanos sem esse tipo de relacionamento. Como – diz-se – reza uma máxima Zulu, “uma pessoa é uma pessoa através de outras pessoas”.

A rigor, como uma configuração de pessoas está sempre ligada a outras configurações, todas as pessoas estão de algum modo emaranhadas (entangled) no espaço-tempo dos fluxos (quem sabe não era isso que chamávamos de humanidade, uma prefiguração). Assim, no limite, todas as pessoas são feitas de todas as outras pessoas.

Nessas condições, a identidade da pessoa não é a manutenção de uma condição pregressa e sim uma trajetória particular de mudanças. Nenhuma pessoa é igual à outra, cada pessoa é unique na medida em que não há duas trajetórias iguais.

ALOSTASE SOCIAL

Aprender (humanamente) é despertar o ente criativo que existe no clone social chamado pessoa

Por isso se diz que uma teoria interativista da aprendizagem humana não se baseia em uma teoria do conhecimento e sim numa teoria da alostase social. Mas alostase social não é autopoiese e sim alterpoiese. Seu único fundamento é a liberdade: a livre-aprendizagem (como ocorre, para citar alguns exemplos, na busca-com-polinização, na co-investigação e na cocriação, quando pessoas se associam livremente para resolver um problema que as desafia ou para desenvolver um projeto comum que parte de seus desejos).

Deslindar aprendizagem de conhecimento é uma aventura inusitada, uma operação arriscada que quase ninguém teve a ousadia de fazer (no campo da chamada pedagogia ninguém o fez completamente até agora). A não ser alguns livre-pensadores, como Jiddu Krishnamurti (1972), que tiveram a liberdade suficiente para afirmar que “aprender é um movimento não ancorado no conhecimento. Se está ancorado, não é um movimento. A máquina, o computador, estão ancorados. Esta é a diferença básica entre o homem e a máquina. Aprender é estar vigilante, ver. Se você vê com base no conhecimento acumulado, então o ver é limitado e não há coisa nova no ver… Nossa educação é a obtenção de um volume de conhecimentos, e o computador faz isso mais rápido e mais acuradamente. Que necessidade há de tal educação? As máquinas irão encarregar-se da maioria das atividades do homem. Quando você diz, como as pessoas dizem, que aprender é a obtenção de um certo volume de conhecimento, nesse caso, você está negando – não está? – o movimento da vida, que é relacionamento e comportamento” (10).

Por enquanto podemos afirmar, entretanto, que (no que concerne à aprendizagem tipicamente humana) a resposta genérica para a pergunta fundamental – Quem aprende? – já está dada: definitivamente, quem aprende é a pessoa. À pergunta seguinte – O que acontece quando a aprendizagem acontece? – também pode ser dada assim: a pessoa se modifica. Isto é alostase social.

Não é que ela adquire mais algum conteúdo, ficando mais “gorda” de conhecimentos. É que ela deixa de ser aquela pessoa que era e passa a ser, rigorosamente falando, outra pessoa: ela se move ao longo da trajetória de adaptações que a constitui e constrói enquanto a percorre com liberdade (ou seja, escolhendo e criando seu próprio caminho de interação com o outro).

Interagir livremente, se deixar alterar-pelo-outro e com-o-outro, já é antecipação do metabolismo de um simbionte social. A aprendizagem (tipicamente humana) desse ponto de vista, é algo muito diferente do que imaginávamos.

Toda aprendizagem tipicamente humana é social. Aprender (humanamente) é despertar o ente criativo que existe no clone social chamado pessoa. Não é bem se adaptar responsivamente – como que por reflexo – à mudanças do mundo, mas se criar a cada instante recriando os mundos dos outros espelhados em nós, de sorte que cada qual possa dizer, como diria Leminski: “vejo as coisas como somos“.

Agora então começa.

A APRENDIZAGEM TIPICAMENTE HUMANA

Toda aprendizagem tipicamente humana é livre-aprendizagem

Os requisitos para a elaboração de uma teoria da aprendizagem humana podem ser classificados em duas categorias: a) requisitos para uma teoria interativista da aprendizagem; e b) requisitos para uma teoria interativista da aprendizagem humana. No que tange à primeira categoria – requisitos para uma teoria interativista da aprendizagem – já temos a enorme contribuição de Maturana (e Varela) que pode ser resumida nas ideias de autopoiese e acoplamento estrutural e, sobretudo, na visão não-informacionista (ou não cognitivista) que se revela na constatação fundamental de que as interações não são instrutivas.

Mas falta uma parte, que eles não exploraram (e, a rigor, não poderiam mesmo fazê-lo, pois o problema não estava colocado quando escreveram suas contribuições). A parte que falta pode ser preenchida, mas também apenas em parte, pelas contribuições de Siemens e Downes com o conectivismo, em especial com as ideias de que a aprendizagem acontece quando o sujeito é capaz de reconhecer e interpretar padrões que estão distribuídos na rede; que esse processo (de aprendizagem) é influenciado pela diversidade das redes, pela força dos vínculos (ou laços) e pelo contexto em que ocorre; que o papel da memória é adaptativo; que a transferência (de conteúdo) ocorre pela conexão (adição) de nodos que faz crescer a rede social, conceitual e biológica dos aprendentes; e, finalmente, que tudo isso seria capaz de explicar o aprendizado complexo, a rápida mudança de core verificada no processo e a diversidade (com a ampliação incalculável) das fontes de conhecimento.

É claro que tudo isso deve ser corrigido pela constatação de que a conexão (que é apenas um dos elementos da interação ou uma maneira de olhá-la) não é um canal ou um tubo para a informação trafegar ou para um conhecimento ser transferido de um emissor a um receptor ou mesmo trocado ou compartilhado como se fosse um conteúdo já dado ex ante à interação. Ademais, o conectivismo é somente uma porta de entrada para o interativismo (e se levarmos em conta a interação – e não apenas a conexão stricto sensu -, teremos que reconhecer que ela não é instrutiva: há interação quando os interagentes se modificam, ou seja, modificam-seu-comportamento-no-relacionamento e não quando recebem uma mensagem ou adquirem alguma informação ou conteúdo). Ao contrário do que acredita boa parte dos biólogos, a chave para o fato de os humanos serem únicos (no sentido de tão diferentes dos outros seres vivos, em especial dos outros primatas) não está na maneira como conseguimos organizar, transferir e adquirir informações.

Feito o reparo, entretanto, ficaria ainda faltando uma parte e essa parte que falta, para uma teoria interativista da aprendizagem, diz respeito à fenomenologia da interação. Essa parte não pode ser preenchida pelas contribuições de Maturana e Varela ou de Siemens e Downes, mas somente pela aplicação das descobertas da nova ciência das redes ao fenômeno geral da aprendizagem (embora não ainda da aprendizagem tipicamente humana).

Muitas perguntas precisam ser respondidas. Qual o papel do cloning na aprendizagem? Como se conforma o sujeito da aprendizagem (e quem aprende?) e qual o papel do clustering nesse processo? Qual a relação entre a aprendizagem e a chamada inteligência coletiva (ou swarm-intelligence) e que papel cumpre o swarming na emergência do aprendedor ou aprendente coletivo? Quais são as consequências do crunching (redução da extensão característica de caminho ou queda dos graus de separação) no processo de aprendizagem? Como a reverberação, a formação irruptiva de múltiplos laços de retroalimentação de reforço (feedbacks positivos em cascata) e os loopings (que geram armadilhas de fluxos, repetindo passado) interferem em cada caso e em todos os casos? Enquanto não formos capazes de responder essas perguntas – e, na verdade, ainda não o somos – não há como formular integralmente uma teoria interativista da aprendizagem. Mas mesmo que conseguíssemos todas as respostas para as perguntas acima, ainda estaríamos longe de uma teoria interativista da aprendizagem humana. Saberíamos mais um pouco sobre como organismos e aglomerados ou nuvens de organismos (e até como seres não-vivos capazes de interagir) aprendem, mas não como sociedades aprendem, quer dizer, como pessoas aprendem.

No que tange à segunda categoria – requisitos para uma teoria interativista da aprendizagem humana – só temos pistas por enquanto.

A primeira pista é que é uma teoria da aprendizagem humana é uma teoria interativista.

A segunda pista é que uma teoria da aprendizagem humana é uma teoria interativista social.

A terceira pista é que nem tudo que vale para uma teoria interativista da aprendizagem geral vale para uma teoria interativista da aprendizagem tipicamente humana.

Para uma teoria interativista da aprendizagem tipicamente humana as ideias centrais, como vimos, são a alostase social e a alterpoiese. Mas essas ideias são metáforas úteis do ponto de vista heurístico, não conceitos integrantes de um corpo teórico coerente. Ainda são noções vagas demais para compor uma explicação científica.

O QUE NOSSA INVESTIGAÇÃO SOBRE APRENDIZAGEM TEM REVELADO

Para ficar com o que já temos, entretanto, podemos elencar alguns pontos fundamentais sobre o que nossa investigação sobre aprendizagem tem revelado.

A aprendizagem é um processo interativo. Somente redes podem aprender. A aprendizagem ocorre em seres vivos (organismos, partes de organismos e ecossistemas) e em redes de seres vivos (conjuntos de seres vivos em interação), em redes de seres não-vivos (capazes de interagir) e em seres sociais (pessoas ou redes de pessoas). O animal humano (o indivíduo da espécie homo sapiens) pode aprender por meio de processos que são comuns aos seres vivos. Esses processos são interativos (não-instrutivos). Os seres humanos podem aprender por meio de processos que não são comuns aos seres vivos, mas que ocorrem apenas entre humanos: esta é a aprendizagem tipicamente humana. Na aprendizagem tipicamente humana quem aprende é a pessoa. Quando aprende, a pessoa se modifica. A pessoa se modifica quando muda de comportamento no relacionamento com outras pessoas (alostase social). Quando a pessoa se modifica, modificam-se necessariamente a topologia e a dinâmica do emaranhado (a rede) onde ela está e é (quer dizer, existe como pessoa). Quando a pessoa se modifica, criam-se novos mundos sociais (novos emaranhados, novas redes). Toda aprendizagem tipicamente humana é criativa, não reprodutiva. O único fundamento da aprendizagem tipicamente humana é a liberdade (que depende da livre-interação entre pessoas). Toda aprendizagem tipicamente humana é livre-aprendizagem. A livre-aprendizagem é criativa: é uma criação-entre (alterpoiese).

Das sentenças acima pode-se inferir (pulando talvez algumas passagens) que a livre-aprendizagem (a aprendizagem tipicamente humana) acontece quando pessoas aprendem na sua livre-interação; ou seja, quando seus caminhos não são bloqueados, restringidos ou pré-determinados ou quando não são forçadas a aprender (11). E também quando aprender não é necessário para alcançar algum objetivo já prefigurado.

É o que sabemos até agora. Mas a investigação continua.

NOTAS E REFERÊNCIAS

(1) Maturana (1992) resume a ideia de autopoiese da seguinte maneira. “Um ser vivo não é um conjunto de moléculas, mas uma dinâmica molecular, um processo que acontece como unidade separada e singular como resultado do operar e no operar, das diferentes classes de moléculas que a compõem, em um interjogo de interações e relações de proximidade que o especificam e realizam como uma rede fechada de câmbios e sínteses moleculares que produzem as mesmas classes de moléculas que a constituem, configurando uma dinâmica que ao mesmo tempo especifica em cada instante seus limites e extensão. É a esta rede de produção de componentes, que resulta fechada sobre si mesma, porque os componentes que produz a constituem ao gerar as próprias dinâmicas de produções que a produziu e ao determinar sua extensão como um ente circunscrito, através do qual existe um contínuo fluxo de elementos que se fazem e deixam de ser componentes segundo participam ou deixam de participar nessa rede, o que neste livro denominamos autopoiese”. MATURANA, Humberto (1992). Vinte Anos Depois (Prefácio de Humberto Maturana Romesin à segunda edição). In MATURANA, Humberto e VARELA, Francisco (1992). De máquinas e seres vivos. Autopoiese: a organização do vivo. Artes Médicas: Porto Alegre, 1997.

(2) O conectivismo – de George Siemens e Stephen Downes – tenta dar uma resposta para a questão da aprendizagem a partir da realidade emergente de uma sociedade em rede, sobretudo a partir da disponibilidade de novas mídias sociais. Confunde um pouco a rede (as pessoas interagindo, o padrão social de interação mais distribuído do que centralizado) com as ferramentas tecnológicas (a “tecnosfera”) que ampliam e aceleram a conectividade e a interatividade; ou, às vezes, tomam as redes como “redes de conhecimento” (como se pudesse existir uma rede social que não fosse rede de conhecimento ou como se o conteúdo que “trafega” pelas conexões fosse de algum modo relevante para descrever o comportamento da rede, quer dizer, do emaranhado de conexões). É uma visão mais impactada pelo surgimento da Internet do que informada pela nova fenomenologia da interação social que vem sendo descoberta no presente século pela nova ciência das redes. Ao fim e ao cabo o chamado conectivismo é mais um cognitivismo. Todavia, pode fornecer algumas pistas para chegarmos a uma visão da aprendizagem mais coerente com a fenomenologia da interação. Quando as pistas abertas por Siemens e Downes se encontrarem com as ideias seminais de acoplamento estrutural (Maturana e Varela) e com as descobertas mais recentes da fenomenologia da interação, é possível que consigamos chegar a uma visão realmente interativista da aprendizagem. Mas isso ainda estará longe de uma teoria da aprendizagem (tipicamente) humana, quer dizer, social (como veremos no decorrer do texto).

(3) Cf. MATURANA, Humberto (1982). Aprendizaje o deriva ontogénica. Disponível no link: http://goo.gl/ehFPcz

(4) Idem.

(5) Idem-idem.

(6) Idem-ibidem.

(7) Cf. VARELA, Francisco (1991). Organism: a meshwork of selfness selves. In TAUBER, F. (ed.), Organism and the origin of self. Dordrecht: Kluwer Assoc., 1991.

(8) Francisco Varela (1994) problematizou a “expansão da ideia de autopoiese além da biologia, no âmbito das ciências humanas“. Segundo ele “nestes casos a autopoiese aparece cumprindo um papel metafórico, ou mais especificamente, metonímico“, como quando o conceito é usado para caracterizar um sistema social. Varela então distingue “dois modos de transposição da ideia original: 1) uma utilização literal ou estrita da ideia; 2) uma utilização por continuidade. Com o primeiro modo – prossegue ele – faço referência ao fato que tem havido repetidas tentativas de caracterizar, por exemplo, uma família como um sistema autopoiético, de maneira que a noção seja aplicada estritamente neste caso. Tais tentativas se fundem, em minha opinião, em um abuso de linguagem. Na ideia de autopoiese as noções de rede de produções e de fronteira possuem um sentido mais ou menos preciso. Quando a ideia de uma rede de processos se transforma em “interações entre pessoas”, e a membrana celular se transforma na “fronteira” de um agrupamento humano, incorre-se em usos abusivos… A utilização da autopoiese por continuidade é outra: trata-se de tomar a sério o fato de que autopoiese procura colocar a autonomia do ser vivo no centro da caracterização da biologia, e abre ao mesmo tempo a possibilidade de considerar os seres vivos como dotados de capacidade interpretativa desde sua origem própria. Quer dizer que permite ver que o fenômeno interpretativo é contínuo desde a origem até sua manifestação humana. No geral, estou de acordo com esta utilização e esta possível extensão… [Mas] em resumo, acredito que ficará claro ao leitor que, no geral, tenho um grande ceticismo a respeito da extensão do conceito além da área para o qual foi pensado, isto é, para a caracterização da organização dos sistemas vivos em sua expressão mínima“. VARELA, Francisco (1992). Prefácio de Francisco J. García Varela à segunda edição. In MATURANA, Humberto e VARELA, Francisco (1992). De máquinas e seres vivos. Autopoiese: a organização do vivo. Artes Médicas: Porto Alegre, 1997.

(9) Não é certo se Maturana entendeu isso. No prefácio à segunda edição do De máquinas e seres vivos, intitulado Vinte Anos Depois, por exemplo, ele escreveu que “tem-se formulado a possível existência de sistemas autopoiéticos em outros âmbitos fora do domínio molecular. Esta pergunta não se deve responder de forma singela. Certamente, é possível distinguir, entre os seres vivos, sistemas autopoiéticos de diferentes ordens, segundo o domínio no qual estes se efetuam. Em tal distinção, as células são sistemas autopoiéticos de primeira ordem enquanto elas existem diretamente como sistemas autopoiéticos moleculares, e os organismos somos sistemas autopoiéticos de segunda ordem, pois somos sistemas estabelecidos como agregados celulares. Sem dúvida, é possível falar de sistemas autopoiéticos de terceira ordem ao considerar, por exemplo, o caso de uma colmeia, ou de uma colônia, ou de uma família ou de um sistema social como sendo um agregado de organismos. Porém, ali o autopoiético resulta do agregado de organismos e não é o definitório ou próprio da colmeia, ou da colônia, ou da família, ou do sistema social, como a classe particular de sistema que cada um desses sistemas é. Ao destacar e colocar ênfase no caráter autopoiético de terceira ordem de tais sistemas, qual tal autopoiese é de fato algo circunstancial em relação à constituição de seus componentes, e não o que os define como colmeia, colônia, família, ou sistema social, o próprio de cada um deles como sistema fica oculto. Assim, por exemplo, ainda que é indubitável que os sistemas sociais sejam sistemas autopoiéticos de terceira ordem pelo simples fato de serem sistemas constituídos por organismos, o que os define como o que são, enquanto sistemas sociais, não é a autopoiese de seus componentes, mas a forma de relação entre os organismos que os compõem, e que notamos na vida cotidiana no preciso instante em que os diferenciamos em sua singularidade como tais ao usar a noção de “sistema social”. O que não se pode esquecer nem deixar de lado, é que estes sistemas autopoiéticos de ordem superior se realizam através da realização de seus componentes“. Para Maturana, sistemas sociais não são sistemas autopoiéticos de primeira ordem. E “tampouco os sistemas sociais são sistemas autopoiéticos em outro domínio que não seja o molecular. Sem dúvida, não o são no domínio orgânico, já que nesse domínio o que define o social são relações de conduta entre organismos. Também não o são, ou poderiam sê-lo, em um espaço de comunicações, como propõe o distinguido sociólogo alemão Niklas Luhmann, porque em tal espaço os componentes de qualquer sistema seriam comunicações, não seres vivos, e os fenômenos relacionais que implicam o viver dos seres vivos, que de fato destacamos na vida cotidiana ao falar do social, ficariam excluídos. Eu diria ainda mais que um sistema autopoiético, num espaço de comunicações, é semelhante ao que distinguimos ao falar de uma cultura“. De qualquer modo, acrescenta Maturana que, “se o que faz o ser vivo, ser vivo, é o fato de ser um sistema autopoiético molecular, o que o faz o sistema social, sistema social, não pode, de maneira alguma, ser o mesmo, já que o sistema social surge como sistema diferente do sistema vivo ao surgir na distinção como social, e quando sua realização envolva o viver dos seres vivos que lhe dão origem“. MATURANA, Humberto (1992). Vinte Anos Depois (Prefácio de Humberto Maturana Romesin à segunda edição). In MATURANA, Humberto e VARELA, Francisco (1992). De máquinas e seres vivos. Autopoiese: a organização do vivo. Artes Médicas: Porto Alegre, 1997.

(10) KRISHNAMURTI, Jiddu (1972) em “A única revolução” (originalmente intitulado “A outra margem do caminho”, organizado por Mary Lutyens). São Paulo: Terra Sem Caminho, 2002

(11) Isso não significa que seres humanos não possam aprender por meio de processos interativos que não são os de uma aprendizagem tipicamente humana. Mas apenas que essa não será uma aprendizagem tipicamente humana.