Não se pode ter como foco o “cliente-pobre”
Depois de duas décadas lidando com o tema, em termos teóricos e práticos, eis a conclusão a que cheguei.
A pobreza não é uma “doença” de pessoas e sim o resultado de uma configuração coletiva (social ou, como diria Maturana, antissocial) avessa ao desenvolvimento de suas potencialidades (das pessoas, quer dizer, dos emaranhados particulares onde essas pessoas estão – e são, como tais).
Para superar a pobreza não se pode ter como foco o “cliente-pobre”, pois a superação da pobreza é, precisamente, o estabelecimento de novos caminhos (atalhos: é o termo técnico) para fora dos clusters de pobreza (que tendem a reproduzir – inclusive intergeracionalmente – a pobreza).
É preciso, portanto, fazer netweaving nas redes de pessoas que vivem em situação de pobreza ou extrema-pobreza, sem excluir as pessoas que não estão nesta situação. Repetindo: essas redes não podem ser compostas apenas pelas pessoas em situação de pobreza e extrema pobreza. Elas devem incluir, necessariamente, as demais pessoas das localidades pobres que podem (e devem) ser envolvidas no esforço de superação da pobreza. Isto é o que se pode chamar propriamente de inclusão: acolhimento, estabelecimento de relações sociais (stricto sensu). Só comunidades humanas podem incluir socialmente humanos: não o Estado, nem o mercado.
A questão é que, mesmo que as redes existam independentemente de nossos esforços conectivos voluntários, as pessoas só se encontrarão (e reconhecerão) como membros dessas redes na medida em que forem estabelecendo relações entre si. E, para tanto, existem apenas dois caminhos:
a) aumentar a conectividade geral dos ambientes onde vivem essas pessoas, possibilitando a multiplicação dos laços fracos entre elas; e
b) incrementar as relações amistosas que podem surgir entre essas pessoas quando elas se juntam a partir de seus desejos congruentes para fazer qualquer coisa.