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Novos mundos glocais

Sobre o artigo intitulado 7 passos para ser feliz em um mundo pequeno e local. Seguem uma tradução livre do original em espanhol e depois alguns comentários do ponto de vista de um mundo pequeno (por efeito de crunching), não local, mas glocal.

1 – Consumir produtos da temporada. Desse modo retomamos o contato com as estações, cada uma das quais nos premia com sabores e aromas diferentes.

2 – Descobrir as lojas de bairro. Ainda que os preços sejam mais caros do que os dos supermercados, o tratamento familiar é importante para a sensação de pertencimento à comunidade.

3 – Caminhar mais. Se nosso trabalho fica muito longe para ir de bicicleta, no tempo livre deveríamos praticar o exercício mais suave e saudável do mundo: caminhar. Entre meia hora e uma hora diária é uma boa.

4 – Travar amizade com os vizinhos. É muito agradável encontrar na rua pessoas com as quais temos algo em comum. Pertencer a algum clube ou associação local possibilita estreitar laços com pessoas próximas.

5 – Conhecer melhor o nosso entorno. Podemos passar a vida em um lugar porem limitados às mesmas ruas e lugares. Antes de sair para explorar o grande mundo, deveríamos conhecer os segredos do pequeno mundo que nos rodeia.

6 – Dar festas em casa. Para não deixar que nosso lar caia na monotonia, convidar amigos para jantar ou organizar tertúlias literárias é uma maneira de desfrutar dos prazeres simples e simultaneamente sofisticados.

7 – Ler e escrever. Já que viver em um mundo pequeno não implica ter uma visão pequena, um livro é a maneira mais cômoda e ecológica – e frequentemente intensa – de viajar. Pelo mesmo motivo, ao compartilhar nossos pensamentos por escrito, por exemplo, por e-mail, ampliamos nosso círculo social sem sair de casa.

É claro que todos os conselhos acima são legais. Todavia, nesta época de uma emergente sociedade-em-rede, na qual já vivemos, eles parecem um pouco nostálgicos. Os redatores das recomendações chegam a falar de uma volta às origens… Mas nossos mundos estão ficando pequenos não porque estão se apartando de outros mundos (em clusters sem atalhos), ou porque sejam geográfico-populacionalmente pequenos e nem porque estão tentando permanecer em algum lugar do passado para resistir conservadoramente à globalização. Eles estão ficando pequenos por efeito de crunching (amassamento), que está reduzindo o tamanho social dos mundos em termos sociais (diminuindo os graus de separação). Numa sociedade cada vez mais em rede está disponível, cada vez mais, a conexão local-global. A revolução do local é o glocal: o encontro da globalização do local com a localização do global, de sorte que o local conectado vira o mundo todo. Ou seja, o localismo não-anacrônico hoje é um localismo cosmopolita, quer dizer, um glocalismo.

Assim, dever-se-ia acrescentar às sete recomendações acima, a de permanecer aberto à interação com o outro-imprevisível, não importando para nada se esse outro reside ou trabalha na localidade física onde você está. Daí podem sair também muitas comunidades de prática, de aprendizagem e de projeto que vão se agregar à comunidade de vizinhança imaginada nas sete recomendações acima. E é claro que isso não pode ser feito só por correio eletrônico. As mídias sociais devem ser usadas, assim como as mais diversas plataformas interativas e programas de relacionamento peer-to-peer. Mas também os encontros presenciais viabilizados por intercâmbios: a hospedagem de pessoas de outras localidades e a viagem para outras localidades.

De qualquer forma, uma base comunitária de vizinhança para a formação de mundos glocais é importante. Pode ajudar a ser mais alegre (esse negócio de felicidade é complicado: todas as distopias colocam a felicidade como ideal supremo) e, inclusive, ser mais criativo e saudável, como aconteceu no famoso caso de Roseto (na Pensilvânia).