Uma diatribe sobre a educação
Toda vez que uma criança vem ao mundo, o sistema liga o alerta vermelho. Uma criança, uma simples criança, é sempre um perigo em potencial, uma ameaça a ser neutralizada, uma falha a ser corrigida.
Ela é um problema porque faz perguntas descabidas. Ao lançar seus por quês sobre assuntos que não devem ser questionados — porque todos já sabem que “é assim que funciona” — a criança causa uma instabilidade perigosa no status quo. Suas perguntas podem introduzir erros nas rotinas de reprodução e de recuperação dos modos de vida que os adultos foram programados para conservar. Nenhum establishment resiste a sucessivos por quês. Por que, por que, por que — quando repetidos ad nauseam — podem levar o programa a entrar em looping estragando tudo.
As crianças são também um problema porque não têm qualquer senso de utilidade. Fazem coisas sem objetivo, só assim por fazer, sem pretender chegar a lugar algum. Ademais, costumam brincar de faz de conta e o faz de conta, como todo mundo sabe, é um absurdo tremendo e um perigo danado. O faz de conta leva à pergunta disruptiva: e se? Vai que a moda pega e de repente as pessoas comecem a se perguntar: e se? Faz de conta que… eu sou diferente. Mas se eu fosse mesmo? Agora sou, digamos, um poeta, por que não? E se eu não trabalhasse aqui? Faz de conta que eu sou um mochileiro das galáxias. Hummm… E se eu resolvesse passar um ano viajando sem destino? E se eu… desobedecesse? Pane iminente. Toca a sirene. Perigo! Perigo!
Então as pessoas adultas responsáveis têm que tomar uma providência em relação a essas crianças irresponsáveis. É urgente. “Temos que torná-las iguais a nós”.
A primeira providência, por óbvio, é contorcê-las, espremê-las, ou seja, ensiná-las a ser responsáveis. Para tanto, vão fazer para elas uma agenda cujo objetivo é disciplinar o seu tempo livre. Com tantas coisas programadas a criança não terá tempo para ficar escarafunchando por que, por que, por que e enchendo o saco dos adultos. Não terá tempo para brincar, quer dizer, para fazer coisas que não dão em nada e não levam a lugar algum. Não terá tempo para imaginar situações inexistentes no mundo real. É assim, curada desses delírios, ela ficará mais responsável.
Bem, os adultos já tomaram a providência principal em relação a tudo isso: erigiram instituições para fazer o trabalho sujo de controlar a vida das crianças automaticamente. Dentre os arranjos mais eficazes que os adultos conseguiram construir para violar a alma da criança, sem dúvida, sobressai-se a escola.
A escola foi desenhada para evitar os por quês: nela a criança trocará o por que separado pelo porque junto. Doravante ela terá que responder, não mais perguntar. E a pergunta fundamental, que está na raiz do ato criativo — “e se?” — será então substituída pela resposta genérica sobre o que é porque é: “é assim, repita para mostrar que você entendeu”.
A escola foi planejada para acabar com o faz de conta: agora só conta o que conta ponto no currículo. Nada de perder tempo com o que não leva à nada (brincar só na hora do recreio, uma espécie de respiro, de válvula de escape terapêutica, como os banhos de sol dos presidiários). Tudo deve levar a um resultado e a criança será avaliada com base nesse resultado esperado. É assim que a escola está formatada para matar a criatividade, que é sempre um resultado inesperado.
É por isso que quando olham uma criança, no frescor da sua curiosidade e na plena potência de sua criatividade, os ensinadores só pensam numa coisa: como transformá-la em “um de nós”. E aí vão configurar os ambientes onde a tal educação deveria ocorrer para que aquele ser único e inventivo se converta em mais um exemplar indistinto da massa dos ensinados, um disciplinado e obediente burocrata repetitivo.
Ao fazer isso, simplesmente eles estão desativando — para lembrar uma passagem do saudoso Saint-Exupery (1939), em Terra dos Homens — “o músico adormecido, ou o poeta, ou o astrônomo” que talvez a habitassem.
É de chorar. Mas em geral as pessoas adultas não querem nem ouvir que estão exterminando gênios, destruindo maravilhosas promessas de artistas, cientistas e, sobretudo, de pessoas capazes de desenvolver sua inteligência tipicamente humana.
Dá vontade de dizer-lhes. Sim, isso mesmo. Matem as crianças.
DEVEMOS MELHORAR OU MUDAR A EDUCAÇÃO?
Para saber isso vamos conhecer as principais críticas feitas por pensadores da educação e refletir se nossas atividades estão sintonizadas com a mudança que está vindo, em especial agora que a sociedade está ficando mais interativa e com a inteligência artificial que vai se encarregar de muitas das tarefas que sempre foram executadas por nós. Mais um motivo para tentar descobrir quais são as características de uma aprendizagem tipicamente humana, que nunca poderá ser realizada por máquinas ou programas inteligentes.
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